Irmãos
e irmãs,
Este
Santo Domingo reflete sobre o sentido do sofrimento e dor que acompanham nossa
caminhada e qual a “posição” de Deus face aos dramas que marcam a nossa
existência. E garante-nos que o projeto de Deus para a humanidade não é um
projeto de morte, mas é um projeto de vida verdadeira, de felicidade sem fim.
Na
primeira leitura, um crente chamado Jó comenta, com amargura e desilusão, o fato
de a sua vida estar marcada por um grande sofrimento e de Deus parecer ausente
e indiferente face ao desespero em que a sua existência decorre… Apesar disso,
é a Deus que Jó se dirige, pois, sabe que Deus é a sua única esperança e que
fora d’Ele não há possibilidade de salvação.
O
sofrimento, sobretudo do inocente é, talvez, o drama mais inexplicável que
atinge o ser humano ao longo da sua caminhada pela história. Que razões há para
o sofrimento de uma criança ou de uma pessoa boa e justa? Porque é que algumas
vidas estão marcadas por um sofrimento atroz e sem esperança? Como é que um
Deus bom, cheio de amor, preocupado com a felicidade dos seus filhos, Se situa
face ao drama do sofrimento humano? A única resposta honesta é dizer que não
temos uma resposta clara e definitiva para esta questão. O “sábio” autor do
livro lembra-nos, contudo, a nossa pequenez, os nossos limites, a nossa
finitude, a nossa incapacidade para entender os mistérios de Deus e para
compreender os caminhos por onde se desenrolam os projetos de Deus. De uma
coisa podemos estar certos: Deus ama-nos com amor de pai e de mãe e quer conduzir-nos
ao encontro da vida verdadeira e definitiva, da felicidade sem fim… Talvez nem
sempre sejamos capazes de entender os caminhos de Deus e a sua lógica… Mas,
mesmo quando as coisas não fazem sentido do ponto de vista da nossa humana
lógica, resta-nos confiar no amor e na bondade do nosso Deus e entregarmos confiadamente nas suas mãos, no encontro “face a face”, na novidade infinita do
mistério.
A
segunda leitura sublinha, especialmente, a obrigação que os discípulos de Jesus
assumiram no sentido de testemunhar diante de todos a proposta libertadora de
Jesus. Paulo enfatiza que quando alguém encontra Cristo e se torna discípulo,
não pode ficar parado, mas tem de dar testemunho… A expressão “ai de mim se não
anunciar o Evangelho” traduz esse imperativo que Paulo sente e que brota do seu
amor a Cristo, ao Evangelho e as pessoas. Por amor, ele renunciou aos seus
direitos e fez-se “servo de todos”; por amor, ele renunciou aos seus próprios
interesses e perspectivas pessoais e identificou-se com os fracos, fez-se “tudo
para todos”. O que é fundamental, o que é decisivo, o que é absoluto na vida de
Paulo é o amor.
Evidentemente,
sugere Paulo, deve ser esse o princípio fundamental que condiciona todas as
opções e comportamentos dos cristãos. Implica o dom de si, o esquecimento dos
seus interesses e esquemas pessoais, Na sua ação e no seu testemunho, os
discípulos de Jesus, não podem ser guiados por interesses pessoais, mas sim
pelo amor a Deus, ao Evangelho e aos irmãos e irmãs.
No
Evangelho manifesta-se a eterna preocupação de Deus com a felicidade dos seus
filhos. Na ação libertadora de Jesus em favor de homens e mulheres, começa a
manifestar-se esse mundo novo sem sofrimento, sem opressão, sem exclusão que
Deus sonhou para todos. O texto sugere, ainda, que a ação de Jesus tem de ser
continuada pelos seus discípulos.
O
texto que nos é proposto apresenta-nos Jesus a atuar no sentido de tornar o
“Reino” uma realidade presente no meio do povo. O evangelista propõe-nos dois
quadros: primeiro quadro situa-nos na
“casa de Pedro”. Na narração de Marcos – com uma forte preocupação catequética
– o objetivo fundamental é sugerir que a missão de Jesus consiste em oferecer
aos homens e mulheres a vida nova, a vida definitiva; no segundo quadro, Marcos
apresenta-nos Jesus retirado num lugar solitário, em oração. A oração faz parte
do ministério de Jesus. Está na agenda da sua atividade e dos seus
compromissos. É significativo que a atividade de Jesus termine na oração e que
a atividade de Jesus em favor das multidões parta, de novo, da oração. A oração
é, para Jesus, o cume e a fonte da ação.
O
Santo Evangelho revela-nos que as ações de Jesus em favor de homens e mulheres
mostram a eterna preocupação de Deus com a vida e a felicidade dos seus filhos.
O projeto de Deus para os para o mundo não é um projeto de morte, mas de vida;
o objetivo de Deus é conduzir-nos ao encontro desse mundo novo - o “Reino de
Deus” - de onde estão ausentes o
sofrimento, a maldição e a exclusão, e onde cada pessoa tem acesso à vida
verdadeira, à felicidade definitiva, à salvação. Talvez nem sempre entendamos o
sentido do sofrimento que nos espera em cada esquina da vida; talvez nem sempre
sejam claros, para nós, os caminhos por onde se desenrolam os projetos de Deus…
Mas Jesus veio garantir-nos absolutamente o empenho de Deus na felicidade e na
libertação do homem. Resta-nos confiar em Deus e entregarmos ao seu amor.
A
história da sogra de Pedro que, depois do encontro com Jesus, “começou a
servir” os que estavam na casa, lembra-nos que do encontro libertador com Jesus
deve resultar o compromisso com a libertação dos nossos irmãos. Quem encontra
Jesus e aceita inserir-se na dinâmica do “Reino”, compromete-se com a
transformação do mundo… Compromete-se a realizar, em favor dos irmãos, os
mesmos “milagres” de Jesus e a levar vida, paz e esperança aos doentes, aos
marginalizados, aos oprimidos, aos injustiçados, aos perseguidos, aos que
sofrem.
Assim,
o encontro com Jesus e com o “Reino” é sempre uma experiência libertadora.
Aceitar o convite de Jesus para O seguir e para se tornar “discípulo” significa
a ruptura com as cadeias de egoísmo, de orgulho, de comodismo, de autossuficiência,
de injustiça, de pecado que impedem a nossa felicidade e que geram sofrimento,
opressão e morte nas nossas vidas e nas vidas dos nossos irmãos. Quem se
encontra com Jesus, escuta e acolhe a sua mensagem e adere ao “Reino”, assume o
compromisso de conduzir a sua vida pelos valores do Evangelho e passa a viver no
amor, no perdão, na tolerância, no serviço aos irmãos. É – na perspectiva da
catequese que o Evangelho de hoje nos apresenta – um “levantar-se”, um
ressuscitar para a vida nova e eterna.
Diante
disto, na multidão que se concentra à porta da “casa de Pedro” podemos ver essa
humanidade que anseia pela sua libertação e que grita, dia a dia, a sua
frustração pela guerra, pela violência, pela injustiça, pela miséria, pela
exclusão, pela marginalização, pela falta de amor… A Igreja de Jesus Cristo - a
“casa de Pedro” - tem uma proposta libertadora que vem do próprio Jesus e que
deve ser oferecida a todos estes irmãos que vivem prisioneiros do sofrimento…
O
exemplo de Jesus mostra que o aparecimento do “Reino de Deus” está ligado a uma
vida de comunhão e de diálogo com Deus. Rezar não é fugir do mundo ou
alienar-se dos problemas do mundo e dos dramas dos homens… Mas é uma tomada de
consciência dos projetos de Deus para o mundo e um ponto de partida para o
compromisso com o “Reino”. Só na comunhão e no diálogo íntimo com Deus
percebemos os seus projetos e recebemos a força de Deus para nos empenharmos na
transformação do mundo. É preciso, portanto, que o discípulo encontre espaço,
na sua vida, para a oração, para o diálogo com Deus. Ora, a oração aparece como
condição para o surgimento do “Reino”. É na oração que Jesus encontra a
motivação para a sua ação em prol do “Reino”; é na oração que Jesus encontra a
força para se libertar da tentação da popularidade fácil e para centrar, de
novo, a sua atenção em Deus e nos seus projetos. O encontro pessoal com Deus
significa uma pausa na atividade e um momento de tomada de consciência daquilo
que Deus quer e do compromisso que Deus pede aos seus enviados.
O
nosso texto termina com uma espécie de resumo, no qual se explicita o sentido
do ministério de Jesus: do seu encontro com o Pai, brota uma vontade renovada
de concretizar o projeto de Deus e de atuar no meio dos homens a fim de lhes
oferecer a libertação e a vida definitiva. Anunciam que Deus quer criar um
mundo novo, onde não há impuros, nem condenados; anunciam uma nova era, de
pessoas novas, vivendo a plenitude da vida e da felicidade. É isso que Jesus
veio fazer, e é essa a missão que os discípulos de Jesus devem procurar
concretizar na terra. Anunciar o Evangelho, como dom e serviço aos irmãos e
irmãs. Assim seja! Amém.
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