Irmãos
e irmãs,
Este
Santo Domingo apresenta-nos um Deus cheio de amor, de bondade e de ternura, que
convida todos os homens e todas as mulheres a integrar a comunidade dos filhos
amados de Deus. Ele não exclui ninguém nem aceita que, em seu nome, se inventem
sistemas de discriminação ou de marginalização dos irmãos.
A
primeira leitura apresenta-nos a legislação que definia a forma de tratar com
os leprosos. Impressiona como, a partir de uma imagem deturpada de Deus, os
homens são capazes de inventar mecanismos de discriminação e de rejeição em
nome de Deus.
O
nosso texto denuncia a atitude daqueles que, instalados nas suas certezas e
seguranças, constroem um Deus à medida do homem e que atua segundo uma lógica
humana. O que é aqui especialmente grave e assustador é como, em nome de Deus e
da santidade do Povo de Deus, se criam mecanismos de rejeição, exclusão e marginalização.
Não temos que criar um Deus que atue de acordo com os nossos esquemas mentais,
com as nossas lógicas e preconceitos; o que temos é de tentar perceber e
acolher a lógica de Deus. Assim, a primeira leitura prepara-nos para entender a
novidade de Jesus, essa novidade que o Evangelho de hoje nos apresenta. Jesus
virá demonstrar que Deus não marginaliza nem exclui ninguém e que todos os
homens são chamados a integrar a família dos filhos de Deus.
A
segunda leitura convida os cristãos a terem como prioridade a glória de Deus e
o serviço dos irmãos. O exemplo supremo deve ser o de Cristo, que viveu na obediência
incondicional aos projetos do Pai e fez da sua vida um dom de amor, ao serviço
da libertação de homens e mulheres.
Paulo
deixa claro que, para o cristão, o valor absoluto e ao qual tudo o resto se
deve subordinar é o amor. O cristão sabe que, em certas circunstâncias, pode
ser convidado a renunciar aos próprios direitos, à própria liberdade, aos
próprios projetos porque a caridade ou o bem dos irmãos assim o exigem. Cada
cristão deve ser capaz de ultrapassar o egoísmo e o comodismo, a fim de fazer
da sua própria vida um serviço e um dom de amor aos irmãos e irmãs.
O
Evangelho diz-nos que, em Jesus, Deus desce ao encontro dos seus filhos vítimas
da rejeição e da exclusão, compadece-Se da sua miséria, estende-lhes a mão com
amor, liberta-os dos seus sofrimentos, convida-os a integrar a comunidade do
“Reino”. Deus não pactua com a discriminação e denuncia como contrários aos
seus projetos todos os mecanismos de opressão aos irmãos e irmãs.
No
episódio que o Evangelho de hoje nos propõe, Jesus continua a cumprir a missão
que o Pai lhe confiou e a anunciar o “Reino”. A proposta do “Reino” torna-se
uma realidade no mundo e na vida de todos, não só nas palavras, mas também nos
gestos de Jesus.
A
cena coloca Jesus frente a um leproso, num sítio e num lugar não nomeado… Para
a ideologia oficial, o leproso era um pecador e um maldito, vítima de um
particularmente doloroso castigo de Deus. A sua condição excluía-o da
comunidade e impedia-o de frequentar a assembleia do Povo de Deus. Tinha que
viver isolado, apresentar-se andrajoso e avisar, aos gritos, o seu estado de
impureza, a fim de que ninguém se aproximasse dele. Não tinha acesso ao Templo,
nem sequer à cidade santa de Jerusalém, a fim de não conspurcar, com a sua
impureza, o lugar sagrado. O leproso era o protótipo do marginalizado, do
excluído, do segregado. A sua condição afastava-o, não só da comunidade dos
homens, mas também do próprio Deus.
Assim,
nosso texto fala-nos de um Deus cheio de amor, de bondade e de ternura, que Se
faz pessoa e que desce ao encontro dos seus filhos, que lhes apresenta
propostas de vida nova e que os convida a viver em comunhão com Ele e a
integrar a sua família. É um Deus que não exclui ninguém e que não aceita que,
em seu nome, se inventem sistemas de discriminação ou de marginalização dos
irmãos. Às vezes há pessoas, quase sempre bem intencionadas, que inventam
mecanismos de exclusão, de segregação, de sofrimento, em nome de um Deus
severo, intolerante, distante, incapaz de compreender os limites e as
fragilidades do homem. Trata-se de um atentado contra Deus. O Deus que somos
convidados a descobrir, a amar, a testemunhar no mundo, é o Deus de Jesus
Cristo, isto é, esse Deus que vem ao encontro de cada homem, que Se compadece
do seu sofrimento, que lhe estende a mão com ternura, que o purifica, que lhe
oferece uma nova vida e que o integra na comunidade do “Reino”, nesta família
onde todos têm lugar e onde todos são filhos amados de Deus.
A
atitude de Jesus em relação ao leproso, bem como, aos outros excluídos da
sociedade do seu tempo é uma atitude de proximidade, de solidariedade, de
aceitação. Jesus não está preocupado com o que é política ou religiosamente correto,
ou com a indignidade da pessoa, ou com o perigo que ela representa para uma
certa ordem social… Ele apenas vê em cada pessoa um irmão que Deus ama e a quem
é preciso estender a mão e amar, também. Como é que lidamos com os excluídos da
sociedade ou da Igreja? Procuramos integrar e acolher - os estrangeiros, os
marginais, os pecadores, os “diferentes” - ou ajudamos a perpetuar os
mecanismos de exclusão e de discriminação?
O
gesto de Jesus de estender a mão e tocar o leproso é um gesto provocador, que
denuncia uma Lei iníqua, geradora de discriminação, de exclusão e de
sofrimento. Com a autoridade de Deus, Ele retira qualquer valor a essa Lei e
sugere que, do ponto de vista de Deus, essa Lei não tem qualquer significado.
Hoje temos leis - umas escritas nos nossos códigos legais civis ou religiosos,
outras que não estão escritas mas que são consagradas pela moda e pelo
politicamente correto - que são
geradoras de marginalização e de sofrimento. Como Jesus, não podemos
conformarmo-nos com essas leis e muito menos pautar por elas os nossos
comportamentos para com os nossos irmãos. É, evidentemente, um gesto “humano”,
que manifesta a bondade e a solidariedade de Jesus para com o homem; mas o
gesto de estender a mão tem um profundo significado teológico, pois é o gesto
que acompanha, na história do Êxodo, as ações libertadoras de Deus em favor do
seu Povo. O amor de Deus manifesta-se como gesto libertador, que salva o homem
leproso da escravidão em que a doença o havia lançado. Então, o gesto de tocar
o leproso mostra que a distinção entre puro e impuro consagrada pela Lei não
vem de Deus e não transmite a lógica de Deus; mostra que Deus não discrimina
ninguém, que Ele quer amar e oferecer a liberdade a todos os seus filhos e que
a todos Ele convida a integrar a família do “Reino”, a nova humanidade.
Mais
uma vez, o Evangelho deste domingo propõe à nossa consideração a atitude dos
líderes judaicos. Comodamente instalados no alto das suas certezas e
preconceitos, eles perpetuam, em nome de Deus, um sistema religioso que gera
sofrimento e miséria e não se deixam questionar nem desafiar pela novidade de
Deus. Estão tão seguros e convictos das suas verdades particulares que fecham
totalmente o coração a Jesus e não se reveem nas suas propostas. Esta atitude deve alertar-nos para a necessidade de nos desinstalarmos e de
abrirmos o coração aos desafios de Deus.
O
leproso, apesar da proibição de Jesus, “começou a apregoar e a divulgar o que
acontecera”. Marcos sugere, desta forma, que o encontro com Jesus transforma de
tal forma a vida do homem que ele não pode calar a alegria pela novidade que
Cristo introduziu na sua vida e tem de dar testemunho. Portanto, a purificação do leproso significa que
o “Reino de Deus” chegou ao meio dos homens e anuncia a irrupção desse mundo
novo do qual Deus quer banir o sofrimento, a marginalização, a exclusão. A
misericórdia, a bondade, a ternura de Deus derrama-se sobre o leproso no gesto
salvador de Jesus e dizem-lhe: “Deus ama-te e quer salvar-te”. Assim seja!
Amém.
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