Este
Santo Domingo garante-nos que Deus tem um projeto de salvação e de vida plena
para propor a homens e mulheres e para os fazer passar das “trevas” à “luz”.
Na
primeira leitura, um profeta pós-exílio apresenta-se aos habitantes de
Jerusalém com uma “boa nova” de Deus. A missão deste “profeta”, ungido pelo
Espírito, é anunciar um tempo novo, de vida plena e de felicidade sem fim, um
tempo de salvação que Deus vai oferecer aos “pobres”. Esta “boa notícia” deve
encher de esperança todos aqueles que não têm acesso aos bens essenciais, educação,
saúde, trabalho, justiça, amor, que não têm vez nem voz, que são injustiçados e
explorados, que são mastigados e digeridos por um sistema econômico que gera
exclusão, alienação e miséria…
Existe
um projeto de salvação que Deus tem para oferecer ao seu Povo, especialmente
aos pobres. O profeta garante-lhes que Deus os ama, que não os abandona à sua
miséria e sofrimento e que tem um projeto de vida, de alegria, de felicidade
para propor a cada homem ou a cada mulher. Assim, a descoberta do amor e da
presença libertadora de Deus conduzi-nos ao louvor, à adoração, à alegria.
Na
segunda leitura Paulo explica aos cristãos da comunidade de Tessalônica a
atitude que é preciso assumir enquanto se espera o Senhor que vem… Paulo
pede-lhes que sejam uma comunidade “santa” e irrepreensível, isto é, que vivam
alegres, em atitude de louvor e de adoração, abertos aos dons do Espírito e aos
desafios de Deus.
A
existência cristã é uma caminhada ao encontro do Senhor que vem. Na sua
peregrinação pela história, mergulhados na alegria e na tristeza, no sofrimento
e na esperança, os que creem não podem perder de vista essa meta final que dá
sentido à toda a caminhada. O caminho cristão deve ser percorrido na atenção e
na vigilância, procurando viver com coerência os compromissos assumidos no dia
do Batismo e na fidelidade às propostas de Deus.
Assim,
de acordo com a Palavra de Deus que nos é proposta, esse caminho deve ser
percorrido na alegria… O cristão é alegre, porque sabe para onde caminha e está
certo de que no final da caminhada encontra os braços amorosos de Deus que o
acolhem e o conduzem para a felicidade plena, para a vida definitiva. Nem os
sofrimentos, nem as dificuldades, nem as incompreensões, nem as perseguições
podem eliminar essa alegria serena de quem confia no encontro com o Senhor...
Este caminho deve ser percorrido também num diálogo nunca acabado com Deus. Aquele
que crê é alguém que “ora sem cessar” e “dá graças em todas as circunstâncias”
pelos dons de Deus, pela sua presença amorosa, pela salvação que Deus não cessa
de oferecer em cada passo da caminhada. Este caminho deve ser percorrido, ainda, numa
atitude de permanente atenção aos dons e aos desafios do Espírito.
O
Evangelho apresenta-nos João Batista, a “voz” que prepara homens e mulheres para
acolher Jesus, a “luz” do mundo. O objetivo de João não é centrar sobre si
próprio o foco da atenção pública; ele está apenas interessado em levar os seus
interlocutores a acolher e a “conhecer” Jesus, “aquele” que o Pai enviou com
uma proposta de vida definitiva e de liberdade plena.
Na
primeira parte do nosso texto, apresenta-se João. Dele dizem-se duas coisas:
que é “um homem” e que foi “enviado por Deus”. O agente principal nesta
história é, naturalmente, Deus: é Deus que escolhe este homem e o envia ao
mundo com uma missão concreta. É, habitualmente, este o “método” de Deus: chama
homens, confia-lhes uma missão e, através deles, intervém no mundo. A missão de
João é “dar testemunho da luz”; esta realidade que vem de Deus e com a qual Deus
se propõe construir para homens e mulheres um mundo novo de vida definitiva e de
felicidade total. João não atua por sua própria iniciativa, mas em resposta à
escolha divina e para concretizar uma missão que Deus lhe confiou. Por outro
lado, embora enviado por Deus, João não é “a luz”, isto é, ele não tem a
capacidade de eliminar as trevas que escurecem e desfeiam a vida de homens e
mulheres, porque não tem a capacidade de dar vida. João é apenas “a testemunha”
que vem preparar-nos para acolher este que vai chegar e que será “a luz/vida”.
Na
segunda parte do nosso texto, temos o “testemunho” de João. A cena coloca-nos
diante de uma comissão oficial, enviada de Jerusalém para investigar João e
constituída por sacerdotes e levitas, encarregados, entre outras coisas, de
vigiar a ortodoxia e a fidelidade à ordem religiosa judaica.
A
comissão investigadora começa por interrogar João com uma pergunta
aparentemente inócua: “quem és tu?”. Os interrogadores não tomam posição.
Limitam-se a esperar que o próprio João declare a sua posição e as suas
intenções. João descarta totalmente a hipótese de ser o Messias. Também não
aceita identificar-se com Elias. Tampouco aceita assumir o título de “o
profeta”. Na verdade, João não aceita que lhe atribuam nenhuma função que possa
centrar a atenção na sua própria pessoa. As suas três respostas são negativas.
Ele não busca a sua glória ou a sua afirmação, nem vem em seu próprio nome; a
sua missão é meramente dar testemunho da “luz” e é para essa “luz” que os
holofotes devem ser apontados. A “voz”, através da qual Deus fala, convida-nos
a olhar para Jesus, pois só Ele é “a luz” e só Ele tem uma proposta de vida
verdadeira. João garante-nos: só Jesus é “a luz” que liberta os homens da
escravidão e das trevas e lhes oferece a vida verdadeira e definitiva.
É
dentro deste enquadramento que devemos entender a resposta de João, quando os
seus interlocutores o convidam a definir-se: “eu sou uma voz”. “Voz” é um termo
relacional que supõe ouvintes a quem é comunicada uma mensagem… A “voz” não tem
rosto, é anônima e passa despercebida; o importante é o conteúdo da mensagem. É
isso que João é: uma “voz” através da qual Deus passa aos homens uma mensagem.
É à mensagem e não à “voz” que devemos dar atenção.
A
mensagem que a “voz” veicula é: “endireitai o caminho do Senhor”. Pedia que o
Povo instalado e acomodado, desanimado e frustrado fizesse um esforço para
acolher os desafios de Deus e aceitasse pôr-se a caminho com Deus em direção a
um futuro novo de vida e de esperança. É esta mesma realidade que João é
chamado a acordar no coração do seu Povo.
O
batismo ou imersão na água era um símbolo relativamente frequente no judaísmo.
Era usado como rito de purificação ou para significar a mudança de estado de
vida. O batismo de João significava, provavelmente, a ruptura com a vida das
trevas e o desejo de aderir a uma nova vida. Para João seria, apenas, um
primeiro passo para acolher “a luz”.
João
evita responder diretamente à objeção que os fariseus lhe colocam. Ele prefere
desvalorizar o seu batismo com água e apontar para “aquele” que vem e a quem
João não é digno “de desatar as correias das sandálias”. Esse é que é “a luz”
que vai libertar o homem da escuridão, da cegueira, da mentira, do egoísmo, do
pecado. É como se João dissesse: “não vos preocupeis com o batismo com água que
eu administro, pois ele é, apenas, um símbolo de transformação e de adesão a
uma nova realidade; mas olhai antes para essa nova realidade que já está no
meio de vós e que o Messias vos vai oferecer. É o batismo do Messias, o batismo
no Espírito, que transformará totalmente os corações dos homens, os fará livres
e lhes dará a vida definitiva. Esse que vem batizar no Espírito já está
presente, a fim de iniciar a sua obra libertadora. Procurai conhecê-lo, isto é,
escutá-lo e acolher a sua proposta de vida e de libertação”.
O
“homem chamado João”, enviado por Deus “para dar testemunho da luz”,
convida-nos a pensar sobre a forma de Deus atuar na história humana e sobre as
responsabilidades que Deus nos atribui na recriação do mundo… Deus não utiliza
métodos espetaculares e assombrosos para intervir na nossa história e para
recriar o mundo; mas Ele vem ao encontro para envolver no seu amor através de
pessoas concretas, com um nome e uma história, pessoas “normais” a quem Deus
chama e a quem confia determinada missão. A todos nós, seus filhos, Deus confia
uma missão no mundo – a missão de dar testemunho da “luz” e de tornar presente,
para os nossos irmãos, a proposta libertadora de Jesus.
A
atitude simples e discreta com que João se apresenta é muito sugestiva: ele não
procura atrair sobre si as atenções, não usa a missão para a sua glória ou
promoção pessoal, não busca a satisfação de interesses egoístas; ele é apenas
uma “voz” anônima e discreta que recorda, na sombra, as realidades importantes.
João é uma tremenda interpelação para todos aqueles a quem Deus chama e envia…Com
ele, o profeta, isto é, todo aquele a quem Deus chama e a quem confia uma
missão, deve aprender a ficar na sombra, a ser discreto e simples, de forma a
que as pessoas não o vejam a ele mas às realidades importantes que ele propõe...Neste
Tempo de Advento, a fim de que o Senhor que vem possa nascer na nossa vida,
proclamamos: “Eu sou a voz do que clama no deserto”. Que possamos fazer reviver
em nós a graça que devemos testemunhar junto daqueles que encontrarmos, sejamos "testemunhos de luz". Assim
seja! Amém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Palavra em mim agradece, pois seu comentário é muito importante para a nossa caminhada dialógica.
Obrigado!