domingo, 7 de dezembro de 2014

Ouçamos a voz que clama no deserto!!!


Irmãos e irmãs,
Este Santo Domingo, segundo domingo de Advento, constitui um veemente apelo ao nosso reencontro com Deus, à conversão. Por sua parte, Deus está sempre disposto a oferecer-nos um mundo novo de liberdade, de justiça e de paz; mas esse mundo só se tornará uma realidade quando aceitarmos reformar o coração, abrindo-o aos valores de Deus.

Na primeira leitura, um profeta anônimo da época do Exílio garante aos exilados a fidelidade de Javé e a sua vontade de conduzir o Povo, através de um caminho fácil e direito, em direção à terra da liberdade e da paz. Ao Povo, por sua vez, é pedido que dispa os seus hábitos de comodismo, de egoísmo e de autossuficiência e aceite, outra vez, confrontar-se com os desafios de Deus.
A mensagem de “consolação” que a primeira leitura nos apresenta anuncia a esse povo amargurado, desiludido e frustrado que Deus não o abandonou nem esqueceu e que vai atuar no sentido de oferecer-lhe de novo a vida e a liberdade. Esta mensagem representa um extraordinário “capital de esperança”, oferecido ao Povo de Deus de todas as épocas e lugares… Hoje, sentimo-nos esmagados e frustrados porque a violência e o terrorismo marcam com sangue e sofrimento a vida de tantos dos nossos irmãos, ou porque os pobres e os fracos são esquecidos e colocados à margem da história, ou porque parece que a sociedade global se constrói com egoísmo, com indiferença e com exclusão… O profeta garante-nos que Deus – esse Deus que é eternamente fiel aos compromissos que assumiu para com os seus filhos – não está alheado da nossa história, que Ele continua a vir ao nosso encontro e a oferecer-Se para nos conduzir com amor e solicitude ao encontro da verdadeira vida e da verdadeira liberdade. Assim, é preciso correr riscos, aceitar despojar-se do egoísmo, do comodismo, do materialismo, da escravidão dos bens, dos preconceitos para percorrer, com Deus, esse caminho de regresso à vida nova da liberdade.

A segunda leitura aponta para a parusia, a segunda vinda de Jesus. Convida-nos à vigilância, isto é, a vivermos dia a dia de acordo com os ensinamentos de Jesus, empenhando-nos na transformação do mundo e na construção do Reino. Se os que creem pautarem a sua vida por esta dinâmica de contínua conversão, encontrarão no final da sua caminhada terrena “os novos céus e a nova terra onde habita a justiça”.
A certeza da ressurreição garante-nos que Deus tem um projeto de salvação e de vida para cada homem e mulher; e que este projeto está a realizar-se continuamente em nós, até à sua concretização plena, quando nos encontrarmos definitivamente com Deus. A nossa vida presente não é, pois, um drama absurdo, sem sentido e sem finalidade; é uma caminhada tranquila, confiante em direção a este desabrochar pleno, a essa vida total em que se revelará o Homem Novo e Nova Mulher.
A questão fundamental que os cristãos devem pôr, a propósito da segunda vinda do Senhor, não é a questão da data, mas é a questão de como esperar e preparar esse momento. O autor do nosso texto deixa claro que o que é preciso é estar vigilante. “Estar vigilante” não significa ficar a olhar para o céu à espera do Senhor, esquecendo e negligenciando as questões do mundo e os problemas dos homens; mas significa viver, no dia a dia, de acordo com os ensinamentos de Jesus, empenhando-se na transformação do mundo e na construção do Reino.

No Evangelho, João Batista convida os seus contemporâneos e, claro, os homens e mulheres de todas as épocas, a acolher o Messias libertador. A missão do Messias, diz João, será oferecer a todos (as) este Espírito de Deus que gera vida nova e permite-nos viver numa dinâmica de amor e de liberdade. No entanto, só poderá estar aberto à proposta do Messias quem tiver percorrido um autêntico caminho de conversão, de transformação, de mudança de vida e de mentalidade.
O corpo central do nosso texto apresenta-nos a missão de João Batista, a sua pregação, a reação dos ouvintes, o seu estilo de vida e o testemunho de João sobre Jesus.
Qual é, pois, a missão de João? De acordo com o nosso texto, é ser o “mensageiro” que prepara o caminho para o “Messias”, “Filho de Deus”. A propósito da apresentação da missão de João, o autor apresenta uma citação que atribui ao Profeta Isaías mas que é, na realidade, um conjunto de afirmações retiradas do Êxodo: “Vou enviar à tua frente o meu mensageiro, que preparará o teu caminho. Uma voz clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas”. A acumulação de citações sugere que João é esse mensageiro de Deus do qual falavam as promessas antigas, e que devia vir anunciar e preparar o Povo de Deus para acolher a intervenção definitiva de Javé na história.
Em que consistia a pregação de João? João “apareceu no deserto a proclamar um batismo de penitência para remissão dos pecados”. De acordo com a catequese judaica, o Messias só chegaria quando Israel fosse, na verdade, a comunidade santa de Deus… Antes de o Messias chegar, o Povo devia, portanto, realizar um caminho de purificação e de conversão, de forma a tornar-se um Povo santo. O “batismo de penitência”, literalmente, “baptismo de conversão”, proposto por João deve ser entendido neste contexto e representa um convite à mudança radical de vida, de comportamento, de mentalidade. Na perspectiva de João, provavelmente, este “batismo” é um rito de iniciação à comunidade messiânica: quem aceitava este “batismo” passava a viver uma vida nova e aceitava integrar a comunidade do Messias.
A pregação de João é feita “no deserto”. O “deserto” é, no contexto da catequese judaica, o lugar onde o Povo de Deus realizou uma caminhada de purificação e de conversão. Então, a pregação de João lembrava aos israelitas a necessidade de voltar ao “deserto” e de percorrer um caminho semelhante àquele que os antepassados tinham percorrido.
Como é que os interlocutores de João reagiam às suas propostas? Marcos diz que “acorria a Ele toda a gente da região da Judeia e todos os habitantes de Jerusalém” para serem batizados, confessando os seus pecados. A afirmação de que “toda a gente” acorria ao apelo de João parece manifestamente exagerada… Ao apresentar esta perspectiva ideal da forma como a mensagem foi acolhida pelo Povo, Marcos está, provavelmente, a sugerir o carácter decisivo e determinante da proposta que João faz: não é “mais um” convite à conversão, mas é o último e definitivo apelo de Deus ao seu Povo.
João “vestia-se de pelos de camelo, com um cinto de cabedal em volta dos rins e alimentava-se de gafanhotos e de mel silvestre”. O estilo de vida de João, sóbrio, desprendido, austero, simples, é um convite claro à renúncia aos valores do mundo. É a aplicação prática dessa austeridade de vida e desta renovação de atitudes, de comportamentos e de mentalidade que João pede aos seus conterrâneos. O estilo de vida de João corrobora a mensagem que ele apresenta.
O que é que João diz sobre esse Messias libertador, do qual ele é o arauto e o mensageiro? João fala da “força” do Messias e define a sua missão como “batizar no Espírito”. Tanto a fortaleza como o dom do Espírito são prerrogativas do Messias, segundo a catequese profética. O Messias terá, portanto, a força de Deus e a sua missão será comunicar esse Espírito de Deus, que transforma, renova e recria os corações de homens e mulheres.
Em suma, João é o mensageiro, enviado por Deus para preparar homens e mulheres para a chegada do Messias. A mensagem transmitida por João, com a palavra e com a própria atitude de vida, é um apelo veemente à mudança de vida e de mentalidade, a fim de que a proposta do Messias libertador encontre lugar no coração dos homens. João deixa claro que a missão do Messias é comunicar o Espírito que transforma homens e mulheres.
Desta forma, temos de considerar a mensagem principal do nosso texto… João, o Batista, afirma claramente que preparar a vinda do Messias passa pela “conversão”, isto é, por uma transformação total da pessoa, por uma nova atitude de base, por uma outra escala de valores, por uma radical mudança de pensamento, por uma postura vital inteiramente nova, por um movimento radical que leve-nos a reequacionarmos nossa vida e a colocar Deus no centro da existência e interesses. Neste tempo de Advento, de preparação para a celebração do Natal do Senhor, trata-se de uma proposta com sentido: preparar a vinda de Jesus exige de nós uma transformação radical da nossa vida, dos nossos valores, da nossa mentalidade, é o tempo favorável para limparmos os caminhos da nossa vida, de forma a que Deus possa nascer em nós e, através de nós, libertar o mundo…  Deus espera uma resposta total, radical, decidida, inequívoca à oferta de salvação que Ele faz. Isso significa uma renúncia decidida ao nosso comodismo, à nossa preguiça, ao nosso egoísmo, à nossa autossuficiência e um embarcar decidido na aventura do Reino de Jesus, para definitivamente "ouvirmos a voz que clama no deserto" e “prepararmos os caminhos do Senhor”. Assim seja! Amém.

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