Irmãos e irmãs.
A Basílica de São João de Latrão,
cuja “dedicação” ou consagração aconteceu no ano de 320, é a catedral do Papa,
enquanto Bispo de Roma. Ela é a “mãe de todas as igrejas”, o símbolo das
Igrejas de todo o mundo, unidas à volta do sucessor de Pedro. A Festa da
Dedicação da Basílica de Latrão convida-nos a tomar consciência de que a Igreja
de Deus - que a Basílica de Latrão simboliza e representa - é hoje, no meio do mundo, a “morada de Deus”,
o testemunho vivo da presença de Deus na caminhada histórica dos homens.
Na primeira leitura, o profeta
Ezequiel, dirigindo-se ao Povo de Deus exilado na Babilônia, anuncia a chegada
de um tempo de salvação e de graça, em que Deus vai estabelecer a sua morada no
meio dos homens e vai derramar sobre a humanidade sofredora vida em abundância.
A questão central no texto deste
dia nos propõe como primeira leitura é a da presença de Deus no meio do povo. O
nosso texto garante-nos que Deus nunca desiste de Se fazer uma presença amiga e
reconfortante em nossa caminhada e de derramar sobre a humanidade sofredora
vida em abundância. Trata-se de uma “boa nova” que devemos ter continuamente
presente. Contudo, para nós, que cremos, a certeza de que Deus reside em nosso
meio e derrama continuamente sobre eles vida em abundância é um convite à
serenidade, à confiança e à esperança. O mundo não caminha para um beco sem
saída, pois Deus está presente em cada passo da caminhada histórica da
humanidade. Nós, temos de dar testemunho, diante dos nossos contemporâneos,
desta certeza que nos anima.
Assim, para que a presença de
Deus na nossa história tenha um impacto real na forma como, dia a dia, se
constrói o nosso mundo, é necessário que a humanidade abandone os caminhos do
orgulho e da autossuficiência e aprenda a escutar, com humildade e
simplicidade, as propostas e os desafios de Deus.
Na segunda leitura, Paulo recorda
aos cristãos de Corinto e aos cristãos de todos os tempos e lugares, que são,
no mundo, o Templo de Deus onde reside o Espírito. Animados pelo Espírito, os
cristãos são chamados a viver numa dinâmica nova, seguindo Jesus no caminho do
amor, da partilha, do serviço, da obediência a Deus e da entrega aos irmãos;
vivendo dessa forma, eles tornam Deus presente e atuante no meio da cidade de
homens e mulheres.
É a ação de Deus que se deve a
constituição da comunidade cristã de Corinto. Paulo que esteve no início
histórico da comunidade colocou o alicerce e outros ajudaram a erguer o
edifício; mas, por detrás da ação dos homens, de Paulo ou de qualquer outro,
está Deus e o seu projeto de salvação para os Coríntios. Portanto, a comunidade
cristã de Corinto deve ter consciência de que é um edifício de Deus.
Desta forma, animados pelo
Espírito, os cristãos são chamados a viver numa dinâmica nova, seguindo Jesus
no caminho do amor, da partilha, do serviço, da obediência a Deus e da entrega
aos irmãos, sendo sinal vivo de Deus e as testemunhas de sua salvação diante de
homens e mulheres e nosso tempo. O Templo de Deus que é a comunidade cristã é
santo. Trata-se de uma comunidade que deve marcar a sua diferença em relação ao
mundo, aos valores do mundo, aos esquemas do mundo, à sabedoria do mundo, a fim
de se consagrar inteiramente a Deus.
No Evangelho, Jesus apresenta-Se
como o Novo Templo, o “lugar” onde Deus reside no mundo e onde os homens podem
fazer a experiência do encontro com Deus. É através de Jesus que o Pai
oferece-nos o seu amor e a sua vida.
O Santo Evangelho relata-nos o
gesto de Jesus que pega no chicote de cordas, expulsa do Templo os vendedores
de ovelhas, de bois e de pombas, deita por terra os trocos dos banqueiros e
derruba as mesas dos cambistas, está a revelar-Se como “o Messias” e a anunciar
que chegaram os novos tempos, os tempos messiânicos.
No entanto, Jesus vai bem mais
longe do que os antigos profetas. Ao expulsar do Templo também as ovelhas e os
bois que serviam para os ritos sacrificiais que Israel oferecia a Javé, João é
o único dos evangelistas a referir este pormenor, Jesus mostra que não propõe
apenas uma reforma, mas a abolição do próprio culto. O culto prestado a Deus no
Templo de Jerusalém era, antes de mais, algo sem sentido: ao transformar a casa
de Deus num mercado, os líderes judaicos tinham suprimido a presença de Deus…
Mas, além disso, o culto celebrado no Templo era algo de nefasto: em nome de
Deus, este culto criava exploração, miséria, injustiça e, por isso, em lugar de
potenciar a relação com Deus, afastava de Deus. Jesus, o Filho, com a
autoridade que Lhe vem do Pai, diz um claro “basta” a uma mentira com a qual
Deus não pode continuar a pactuar: “não façais da casa de meu Pai casa de
comércio”.
Os líderes judaicos ficam
indignados. Quais são as credenciais de Jesus para assumir uma atitude tão
radical e grave? Com que legitimidade é que Ele se arroga o direito de abolir o
culto oficial prestado a Javé?
A resposta de Jesus é, à primeira
vista, estranha: “destruí este Templo e Eu o reconstruirei em três dias”. Recorrendo
à figura literária do “mal-entendido” propõe-se uma afirmação; os
interlocutores entendem-na de forma errada; aparece, então, a explicação final,
que dá o significado exato do que se quer afirmar, João deixa claro que Jesus
não Se referia ao Templo de pedra onde Israel celebrava os seus ritos
litúrgicos, mas a um outro “Templo” que é o próprio Jesus, “Jesus, porém,
falava do Templo do seu corpo”. O que é que isto significa? Jesus desafia os
líderes que O questionaram, a suprimir o Templo que é Ele próprio; mas deixa
claro que, três dias depois, esse Templo estará outra vez erigido no meio do
povo. Jesus alude, evidentemente, à sua ressurreição. A prova de que Jesus tem
autoridade para “proceder deste modo” é que os líderes não conseguirão
suprimi-lo. A ressurreição garante que Jesus vem de Deus e que a sua atuação
tem o selo de garantia de Deus.
No entanto, o mais notável, aqui,
é que Jesus Se apresenta como o “novo Templo”. O Templo representava, no
universo religioso judaico, a residência de Deus, o lugar onde Deus Se revelava
e onde Se tornava presente no meio do seu Povo. Jesus é, agora, o lugar onde
Deus reside, onde Se encontra com os homens e onde Se manifesta ao mundo. É
através de Jesus que o Pai oferece-nos o seu amor e a sua vida. Aquilo que a
antiga Lei já não conseguia fazer, estabelecer relação entre Deus e os
homens/mulheres, é Jesus que, a partir de agora, o faz.
Nas palavras e nos gestos de
Jesus, Deus revela-Se e manifesta-lhes o seu amor, oferece a vida plena, faz-Se
companheiro de caminhada e aponta-lhes caminhos de salvação. Somos, assim,
convidados a olhar para Jesus e a descobrir nas suas indicações, no seu
anúncio, no seu “Evangelho”, aquela proposta de vida e de salvação que Deus
nunca desistiu de nos apresentar.
Portanto, os cristãos são aqueles que
aderiram a Cristo, que aceitaram integrar a sua comunidade, que comeram a sua
carne e beberam o seu sangue, que se identificaram com Ele. Membros do Corpo de
Cristo, os cristãos são pedras vivas
deste novo Templo onde Deus Se manifesta ao mundo e vem ao nosso encontro para oferecer
a vida e a salvação. Esta realidade supõe naturalmente, para os que creem,
uma grande responsabilidade… Os homens e mulheres do nosso tempo têm de ver no
rosto dos cristãos o rosto bondoso e terno de Deus; têm de experimentar, nos
gestos de partilha, de solidariedade, de serviço, de perdão dos cristãos, a
vida nova de Deus; têm de encontrar, na preocupação dos cristãos com a justiça
e com a paz o anúncio desse mundo novo que Deus quer oferecer a todos (as),
contemplando e reconhecendo Jesus, o Templo Vivo, que é vida nova e plena. Assim seja!
Amém.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Palavra em mim agradece, pois seu comentário é muito importante para a nossa caminhada dialógica.
Obrigado!