domingo, 21 de setembro de 2014

O Senhor, em sua gratuidade, convida-nos sempre para o Reino


Irmãos e irmãs,
Este Santo Domingo convida-nos a descobrir um Deus cujos caminhos e cujos pensamentos estão acima dos caminhos e dos pensamentos de homens e mulheres, quanto o céu está acima da terra. Sugere-nos, em consequência, a renúncia aos esquemas do mundo e a conversão aos esquemas de Deus.

A primeira leitura pede que voltemos para Deus. “Voltar para Deus” é um movimento que exige uma transformação radical, de forma a que os seus pensamentos e ações reflitam a lógica, as perspectivas e os valores de Deus. O apelo do profeta é, portanto, a um recomeço. O “voltar para Deus” significa, neste contexto, re-equacionar a vida, de modo a que Deus passe a estar no centro da existência. É infletir o sentido da existência, de forma a que Deus e não o dinheiro, o poder, o sucesso, os amigos ... ocupe sempre, na vida em nossa vida, o primeiro lugar.
No entanto, aquele que crê só poderá converter-se a Deus e abraçar os seus esquemas e valores, se se mantiver em comunhão com Ele. É na escuta e na reflexão da Palavra de Deus, na oração frequente, na atitude de disponibilidade para acolher a vida de Deus, na entrega confiada nas mãos de Deus, que descobrirá os valores de Deus e os assumirá. Aos poucos, a ação de Deus irá transformando a nossa mentalidade, de forma a que ele viva e testemunhe Deus e as suas propostas para todos (as).
A conversão é um processo nunca acabado. Todos os dias teremos de optar entre os valores de Deus e os valores do mundo, entre conduzir a sua vida de acordo com a lógica de Deus ou de acordo com a lógica dos homens. Por isso, o verdadeiro crente nunca cruza os braços, instalado em certezas definitivas ou em conquistas absolutas, mas esforça-se por viver cada instante em fidelidade dinâmica a Deus e às tuas propostas.

A segunda leitura apresenta-nos o exemplo de um cristão - Paulo - que abraçou, de forma exemplar, a lógica de Deus. Renunciou aos interesses pessoais e aos esquemas de egoísmo e de comodismo, e colocou no centro da sua existência Cristo, os seus valores, o seu projeto.
Para Paulo, Cristo é que é a autêntica vida. Ele é a razão de ser e de viver do apóstolo. Na perspectiva de Paulo, a morte seria bem vinda, não como libertação das dificuldades e das dores que se experimentam na vida terrena, mas como caminho direto para o encontro definitivo, imediato, sem intermediários, com Cristo. No entanto, Paulo está consciente de que Deus pode ter outros planos e querer que ele continue – para benefício das comunidades cristãs – algum tempo mais na terra, a dar testemunho do Evangelho de Cristo. Paulo aceita isso: por Cristo, está disposto a tudo. Na verdade, não são os interesses de Paulo que contam, mas os interesses de Cristo. O apóstolo vive de Cristo e para Cristo; nada mais lhe interessa. Paulo aparece, neste aspecto, como o perfeito modelo do cristão: para os batizados, Cristo deveria ser o centro de todas as referências e interesses, a “pedra angular” à volta da qual se constrói a existência cristã.

O Evangelho diz-nos que Deus chama todos (as) à salvação, sem considerar a antiguidade na fé, os créditos, as qualidades ou os comportamentos anteriormente assumidos. A Deus interessa apenas a forma como se acolhe o seu convite. Pede-nos uma transformação da nossa mentalidade, de forma a que a nossa relação com Deus não seja marcada pelo interesse, mas pelo amor e pela gratuidade.
No texto que nos é proposto, Jesus continua a instruir os discípulos, a fim de que eles compreendam a realidade do Reino e, após a partida de Jesus, a testemunhem. Trata-se de mais uma “parábola do Reino”.
O quadro que a parábola nos apresenta reflete bastante bem a realidade social e econômica dos tempos de Jesus. A Galileia estava cheia de camponeses que, por causa da pressão fiscal ou de anos contínuos de más colheitas, tinham perdido as terras que pertenciam à sua família. Para sobreviver, estes camponeses sem terra alugavam a sua força de trabalho. Juntavam-se na praça da cidade e esperavam que os grandes latifundiários os contratassem para trabalhar nos seus campos ou nas suas vinhas. Normalmente, cada “patrão” tinha os seus “clientes”, isto é, homens em quem ele confiava e a quem contratava regularmente. Naturalmente, esses trabalhadores “de confiança” recebiam um tratamento de favor. Este tratamento de favor implicava, nomeadamente, que estes “clientes” fossem sempre os primeiros a ser contratados, a fim de que pudessem ganhar uma “jorna” completa - uma “moeda de prata”, que era o pagamento diário habitual de um trabalhador não especializado.
A parábola refere-se, portanto, a um dono de uma vinha que, ao romper da manhã, se dirigiu à praça e chamou os seus “clientes” para trabalhar na sua vinha, ajustando com eles o preço habitual: uma moeda de prata. O volume de tarefas a realizar na vinha fez com que este patrão voltasse a sair a meio da manhã, ao meio-dia, às três da tarde e ao cair da tarde e que trouxesse, de cada vez, novas levas de trabalhadores. O trabalho decorreu sem incidentes, até ao final do dia.
Ao anoitecer, os trabalhadores foram chamados diante do senhor, a fim de receberem a paga do trabalho. Todos, quer os que só tinham trabalhado uma hora, quer os que tinham trabalhado todo o dia, receberam a mesma paga: uma prata. Contudo, os trabalhadores da primeira hora, os “clientes” habituais do dono da vinha, manifestaram a sua surpresa e o seu desconcerto por, desta vez, não terem recebido um tratamento “de favor”.
A resposta final do dono da vinha afirma que ninguém tem nada a reclamar se ele decide derramar a sua justiça e a sua misericórdia sobre todos, sem exceção. Ele cumpre as suas obrigações para com aqueles que trabalham com ele desde o início; não poderá ser bondoso e misericordioso para com aqueles que só chegam no fim? Isto em nada deveria afetar os outros…
Muito provavelmente, a parábola serviu primariamente a Jesus para responder às críticas dos adversários, que O acusavam de estar demasiado próximo dos pecadores, “os trabalhadores da última hora”. Através dela, Jesus mostra que o amor do Pai se derrama sobre todos os seus filhos, sem exceção e por igual. Para Deus, não é decisiva a hora a que se respondeu ao seu apelo; o que é decisivo é que se tenha respondido ao seu convite para trabalhar na vinha do Reino. Para Deus, não há tratamento “especial” por antiguidade; para Deus, todos os seus filhos são iguais e merecem o seu amor.
A parábola serviu a Jesus, também, para denunciar a concepção que os teólogos de Israel tinham de Deus e da salvação. Para os fariseus, sobretudo, Deus era um “patrão” que pagava conforme as ações do homem. Se o homem cumprisse escrupulosamente a Lei, conquistaria determinados méritos e Deus pagar-lhe-ia convenientemente. Segundo esta perspectiva, Deus não dá nada; é o homem que conquista tudo. O “deus” dos fariseus é uma espécie de comerciante, que todos os dias aponta no seu livro de registos as dívidas e os créditos do homem, que um dia faz as contas finais, vê o saldo e dá a recompensa ou aplica o castigo. Para Jesus, no entanto, Deus não é um contabilista, sempre de lápis na mão a fazer as contas para pagar-nos conforme os seus merecimentos; mas é um pai, cheio de bondade, que ama todos os seus filhos (as) por igual e que derrama sobre todos, sem exceção, o seu amor.
Assim, Mateus deixa claro que o Reino é um dom oferecido por Deus a todos os seus filhos, sem qualquer exceção. Judeus ou gregos, escravos ou livres, cristãos da primeira hora ou da última hora, todos são filhos amados do mesmo Pai. Na comunidade de Jesus não há graus de antiguidade, de raça, de classe social, de merecimento… O dom de Deus destina-se a todos, por igual.
Portanto, a parábola convida-nos a perceber que o nosso Deus é o Deus que oferece gratuitamente a salvação a todos os teus filhos (as), independentemente da sua antiguidade, créditos, qualidades, ou comportamentos.  Pois, para Deus, há homens e mulheres, todos seus filhos (as), independentemente da cor da pele, da nacionalidade, da classe social – a quem Ele ama, e em Sua gratuidade, quer oferecer a salvação e a quem convida fazer parte da Igreja de Jesus, desta experiência radical de comunhão universal, para trabalhar em sua vinha/Reino, transfigurando nossas relações/agir nesta mesma gratuidade, pois, "os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos". Assim seja! Amém.


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