domingo, 15 de junho de 2014

Deus Trindade, Deus amor, Deus comunidade


Irmãos e irmãs.
A Solenidade que hoje celebramos não é um convite a decifrar o mistério que se esconde por detrás de “um Deus em três pessoas”; mas é um convite a contemplar o Deus que é amor, que é família, que é comunidade e que criou homens e mulheres para os fazer comungar nesse mistério de amor.

Na primeira leitura, o Deus da comunhão e da aliança, apostado em estabelecer laços familiares com homens e mulheres, Se auto apresenta: Ele é clemente e compassivo, lento para a ira e rico de misericórdia. Ele define-Se como o Deus da relação e da comunhão. Deixa claro que é um Deus “com coração”, e com um coração cheio de amor, de bondade, de ternura, de misericórdia, de fidelidade. Apesar de o seu Povo ter violado os compromissos que assumiu, Deus não só perdoa o pecado do Povo, mas propõe o refazer da “aliança”, pois, acima de tudo, este Deus do amor preza a comunhão; o seu objetivo é integrar a todos na família de Deus.
A questão essencial é esta, Deus ama o seu Povo e cuida dele com bondade e ternura. A sua misericórdia é ilimitada e, aconteça o que acontecer, irá sempre triunfar. Israel, o Povo da aliança, pode estar tranquilo e confiante, pois, Javé, o Deus do amor e da misericórdia, garante a sua eterna fidelidade a esses atributos que caracterizam o seu ser. Assim, para entrarmos no mistério de Deus, é preciso estabelecermos com Ele uma relação de proximidade, de comunhão, de intimidade que nos leve ao encontro da sua voz, dos seus valores, dos seus desafios, “subir ao monte”.

Na segunda leitura, Paulo expressa através da fórmula litúrgica “a graça do Senhor Jesus Cristo, o amor do Pai e a comunhão do Espírito Santo estejam convosco”, a realidade de um Deus que é comunhão, que é família e que pretende atrair os homens para essa dinâmica de amor.
A comunidade cristã é convidada a descobrir que Deus é amor. A fórmula “Pai, Filho e Espírito Santo” expressa essa realidade de Deus como amor, como família, como comunidade. Os membros da comunidade cristã, que pelo batismo aderiram ao projeto de salvação que Deus apresentou aos homens em Jesus e cuja caminhada é animada pelo Espírito, são convidados a integrarem esta comunidade de amor. O fim último da nossa caminhada é a pertença à família trinitária. Esta “vocação” deve expressar-se na nossa vida comunitária. A nossa relação com os irmãos deve refletir o amor, a ternura, a misericórdia, a bondade, o perdão, o serviço, que são as consequências práticas do nosso compromisso com a comunidade trinitária.

No Evangelho, João convida-nos a contemplar um Deus cujo amor é tão grande, a ponto de enviar ao mundo o seu Filho único; e Jesus, o Filho, cumprindo o plano do Pai, fez da sua vida um dom total, até à morte na cruz, a fim de oferecer aos homens a vida definitiva. Nesta fantástica história de amor, que vai até ao dom da vida do Filho único e amado, manifesta-se a grandeza do coração de Deus.
O trecho que nos é proposto faz parte da conversa entre Jesus e um “chefe dos judeus” chamado Nicodemos. A conversa entre Jesus e Nicodemos apresenta três etapas ou fases.
Na primeira, Nicodemos reconhece a autoridade de Jesus, graças às suas obras; mas Jesus acrescenta que isso não é suficiente: o essencial é reconhecer Jesus como o enviado do Pai. Na segunda, Jesus anuncia a Nicodemos que, para entender a sua proposta, é preciso “nascer de Deus” e explica-lhe que esse novo nascimento é o nascimento “da água e do Espírito”. Na terceira, Jesus descreve a Nicodemos o projeto de salvação de Deus, é uma iniciativa do Pai, tornada presente no mundo e na vida dos homens através do Filho e que se concretizará pela cruz/exaltação de Jesus. O nosso texto pertence a esta terceira parte.
Assim, depois de explicar a Nicodemos que o Messias tem de “ser levantado ao alto”, como “Moisés levantou a serpente” no deserto, a fim de que “todo aquele que n’Ele acredita tenha vida definitiva”, Jesus explica como é que a cruz se insere no projeto de Deus. A explicação vem em três passos…
O primeiro refere-se ao significado último da cruz. Esse Homem que vai ser levantado na cruz veio ao mundo, encarnou na nossa história humana, correu o risco de assumir a nossa fragilidade, partilhou a nossa humanidade; e, como consequência de uma vida dedicada a lutar contra as forças das trevas e da morte que escravizavam homens e mulheres, foi preso, torturado e morto numa cruz. A cruz é o último ato de uma vida vivida no amor, na doação, na entrega.
Ora, esse Homem é o “Filho único” de Deus. A expressão evoca, provavelmente, o “sacrifício de Isaac”, Deus comporta-Se como Abraão, que foi capaz de desprender-se do próprio filho por amor … A cruz é, portanto, a expressão suprema do amor de Deus. O quadro dá-nos a dimensão do incomensurável amor de Deus por essa humanidade a quem Ele quer oferecer a salvação.
Qual é o objetivo de Deus ao enviar o seu Filho único ao encontro dos homens? É libertá-los do egoísmo, da escravidão, da alienação, da morte, e dar-lhes a vida eterna. Com Jesus, o Filho único que morreu na cruz, homens e mulheres aprendem que a vida definitiva está na obediência aos planos do Pai e no dom da vida, por amor.
O segundo deixa claro que a intenção de Deus, ao enviar ao mundo o seu Filho único, não era uma intenção negativa. Jesus veio ao mundo porque o Pai nos ama e quer salvar-nos. O Messias não veio com uma missão judicial, nem veio excluir ninguém da salvação. Pelo contrário, Ele veio oferecer a todos, a vida definitiva, ensinando-os a amar sem medida e dando-lhes o Espírito que transforma-nos em Novos Homens e Novas Mulheres.
Portanto, Deus não enviou o seu Filho único ao encontro de pessoas perfeitas e santas; mas enviou o seu Filho único ao encontro de pecadores, egoístas, autossuficientes, a fim de lhes apresentar uma nova proposta de vida… E foi o amor de Jesus, bem como o Espírito que Jesus deixou, que transformou homens e mulheres e os inseriu numa dinâmica de vida nova e plena.
O terceiro descreve as duas atitudes que podemos tomar, diante da oferta de salvação que Jesus faz, quem aceita a proposta de Jesus, adere a Ele, recebe o Espírito, vive no amor e na doação, escolhe a vida definitiva; mas quem prefere continuar escravo de esquemas de egoísmo e de autossuficiência, auto exclui-se da salvação. A salvação ou a condenação não são, nesta perspectiva, um prêmio ou um castigo que Deus dá pelo bom ou mau comportamento; mas são o resultado da escolha livre, face à oferta incondicional de salvação que Deus lhe faz. A responsabilidade pela vida definitiva ou pela morte eterna não recai assim sobre Deus, mas sobre nós.
De acordo com a perspectiva de João, também não existe um julgamento futuro, no final dos tempos, no qual Deus pesa na sua balança os pecados, para ver se há de salvar ou condenar, o juízo realiza-se aqui e agora e depende da atitude que assumimos diante da proposta de Jesus. Em resumo, porque amava a humanidade, Deus enviou o seu Filho único ao mundo com uma proposta de salvação. Essa oferta nunca foi retirada; continua aberta e à espera de resposta. Diante da oferta de Deus, podemos escolher a vida eterna, ou pode excluir-se da salvação.
No dia em que celebramos a Solenidade da Santíssima Trindade, somos convidados a contemplar, com João, esta incrível história de amor e a espantar-nos com o peso que nós, seres limitados e finitos, pequenos grãos de pó na imensidão das galáxias, adquirimos nos esquemas, nos projetos e no coração de Deus. O amor de Deus traduz-se na oferta de vida plena e definitiva. É uma oferta gratuita, incondicional, absoluta, válida para sempre; mas Deus respeita absolutamente a nossa liberdade e aceita que recusemos a sua oferta de vida. A celebração da Solenidade da Trindade, é sobretudo, a contemplação de um Deus que é amor e que é, portanto, comunidade. É a natureza divina de um Deus amor, família e comunidade, comungados neste mistério divino de amor. Assim seja! Amém.


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