Irmãos
e irmãs,
Neste
Santo Domingo, somos convidados a reconhecer a preocupação de Deus em saciar a
“fome” de vida de homens e mulheres. Assim, Deus conta conosco para repartir o
seu “pão” com todos aqueles que têm “fome” de amor, liberdade, justiça, paz e
esperança. Senhor manifesta sua compaixão para conosco e não nos deixa ir
embora sem comer.
Na
primeira leitura, o profeta Eliseu, ao partilhar o pão que lhe foi oferecido com
as pessoas que o rodeiam, testemunha a vontade de Deus em saciar a “fome” do
mundo; e sugere que Deus vem ao encontro dos necessitados através dos gestos de
partilha e de generosidade para com os irmãos que os “profetas” são convidados
a realizar.
O
pão das primícias devia ser apresentado e consagrado a Javé. Desta forma, o homem
que leva os dons ao profeta e do profeta que não os guarda para si, mas os
manda partilhar com as pessoas que o rodeiam. O “servo” do profeta não
acreditava que os alimentos oferecidos chegassem para cem pessoas; no entanto,
chegaram e ainda sobraram.
A
“milagrosa multiplicação” de pães de cevada e de grãos de trigo mostra que
quando somos capazes de sair do egoísmo e temos disponibilidade para partilhar
os dons recebidos de Deus, esses dons chegam para todos e ainda sobram. Revela-se assim a generosidade, solidariedade
e vontade de partilha que não são geradoras de vida e abundância.
Na
segunda leitura, Paulo lembra-nos algumas exigências da vida cristã. E
recomenda especialmente, a humildade, a mansidão e a paciência. Atitudes que
não combinam com egoísmo, orgulho, autossuficiência em relação aos irmãos,
fazendo com que a caridade faça parte das relações que estabelecemos uns com os
outros; o amor deve ser sempre o suporte das nossas relações humanas. A unidade
é um dom de Deus; mas a sua efetivação depende do contributo e do esforço de
cada irmão.
Assim,
a nova vida do cristão exige que vivamos unidos a Cristo, pois, “há um só Corpo e um só Espírito, como existe uma
só esperança” na vida a que todos foram chamados; “há um só Senhor, uma só fé,
um só Batismo; há um só Deus e Pai de todos, que está acima de todos, atua em
todos e em todos se encontra”. Portanto, a Trindade é a fonte última e o modelo
da unidade que os cristãos devem viver, na sua experiência de caminhada
comunitária.
No
Evangelho, João revela-nos Jesus, o Deus que veio ao encontro dos homens, que dá
conta da “fome” da multidão que O segue e propõe libertá-la da sua situação de
miséria e necessidade. Aos discípulos, que vão continuar a mesma missão que o
Pai lhe confiou, Jesus convida a abandonar a lógica do egoísmo e a assumirem
uma lógica de partilha, concretizada no serviço simples e humilde em benefício
dos irmãos. É esta lógica que permite passar da escravidão à liberdade; é esta
lógica que fará nascer um mundo novo.
Neste
contexto, João inicia o relato do milagre da partilha com uma referência à
“passagem do mar”, que na verdade era um lago; lembrando-nos à passagem do Mar
Vermelho por Moisés com o Povo libertado do Egito. Jesus quer fazer o Povo que
o acompanha passar da terra da escravidão para a terra da liberdade. Como
aconteceu com Moisés, com Jesus vai uma grande multidão. A multidão que
acompanha Jesus pretende “ver os milagres que Ele realizava nos doentes”. É uma
multidão marcada pela opressão, que quer experimentar a libertação. Já
perceberam que só Jesus, o libertador, conseguirá ajudá-los a superar a sua
condição de miséria e de escravidão.
A
referência ao “monte” leva-nos a lembrar da Aliança do Sinai e ao monte onde
Deus ofereceu ao Povo, através de Moisés, os mandamentos. Dizer que Jesus subiu
ao “monte” significa dizer que é através de Jesus que se vai realizar a nova
Aliança entre Deus e esse Povo de gente livre que, com Jesus, “atravessou o
mar” em direção à terra da liberdade. Como a “Páscoa” estava próxima, anuncia
um tempo futuro em que o Messias irá libertar definitivamente o Povo de Deus, é
em Jesus que se vão inaugurar os tempos novos da liberdade e da paz.
A
multidão que segue Jesus tem fome e não tem que comer. Remonta-nos, outra vez,
ao Êxodo, ao deserto, quando o Povo que caminhava para a terra da liberdade
sentiu fome. Então, foi Deus que respondeu à necessidade do Povo e lhe deu
comida em abundância; aqui, é Jesus que Se compadece das necessidades da
multidão e tenta remediá-las. Ele mostra, assim, o rosto do Deus do amor e da
bondade, sempre atento às necessidades do seu Povo. Então, envolve a comunidade
dos discípulos: “onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer?”.
A
comunidade de Jesus tem de sentir-se responsável pela “fome” de todos e tem de
sentir que é sua responsabilidade e missão saciar essa “fome”. Filipe constata
a impossibilidade de resolver o problema, numa perspectiva econômica: “Duzentos
denários não bastariam para dar um pedaço a cada um”, ou seja, confiando no
sistema instituído, de compra e venda, é impossível resolver o problema dos que
têm fome. A comunidade de Jesus é convidada, portanto, a abandonar este sistema
e encontrar outros. André, porém, visualiza uma solução diferente, consciente
da proposta de Jesus. No entanto, André não está muito convicto do resultado: “o
que é isso para tanta gente?”. Então, Jesus vai provar que é possível
encontrar outro sistema que reparta vida e que elimine a lógica da exploração.
O
“menino” que aparece na cena da “multiplicação” dos pães representa a fragilidade
da comunidade de Jesus face às enormes carências do mundo, indica também um
“menino” e um “servo”. É essa comunidade simples e humilde, vocacionada para o
serviço, que é chamada a resolver a questão da necessidade dos pobres e a
instaurar um novo sistema libertador.
Os
números “cinco pães” e “dois peixes”, também não aparecem por acaso: a sua soma
dá “sete” – o número que significa totalidade, ou seja, é na partilha da
totalidade do que a comunidade possui que se responde à necessidades do Povo. É
uma totalidade fracionada e diversificada; mas que, posta ao serviço dos
irmãos, sacia a fome do mundo. Desta forma, sobre os alimentos disponibilizados
pela comunidade, Jesus pronuncia uma “ação de graças”, reconhecendo que os bens
são dons que vêm de Deus, portanto, pertencem a todos e que quem os possui é
apenas um administrador encarregado de colocá-los à disposição de todos os
irmãos, com a mesma gratuidade com que os recebeu. Os bens são, assim, libertos
da posse exclusiva de alguns, para ser dom de Deus para todos os homens e
mulheres. É este o sistema que Deus quer instaurar no mundo; e a comunidade
cristã é chamada a testemunhar esta lógica. A benção de Jesus sobre os pães e
peixes que os discípulos lhe trazem significa dedicar a Deus aquilo que é de
Deus, libertando do sentimento de posse, abrindo para o dom de Deus que coloca
ao alcance de todos.
Saciada
a fome do mundo, através desses bens que a comunidade recebeu de Deus e que pôs
ao serviço de todos, os discípulos são chamados a outras tarefas. Há sobras que
não se podem perder, mas que devem ser o princípio de outras abundâncias. É
preciso multiplicar incessantemente o amor e o pão. E a comunidade, uma vez
percebido o projeto de Jesus, deve usar o que tem para continuar a oferecer a
vida a todos. Os doze cestos recolhidos pelos discípulos é uma referência a
Israel - as doze tribos: se a comunidade dos discípulos souber partilhar aquilo
que recebeu de Deus, pode satisfazer a fome dos povos de todo o mundo.
Diante
disso, alguns dos que testemunharam a “multiplicação” dos pães e dos peixes têm
consciência de que Jesus é o Messias que devia vir para dar ao seu Povo vida em
abundância e querem fazê-lo rei. Jesus não aceita, Ele não veio resolver os
problemas do mundo instaurando um sistema de autoridade e de poder; mas veio
convidar os homens a viverem numa lógica de partilha e de solidariedade, que se
faz dom e serviço humilde aos irmãos. É dessa forma que Ele se propõe – com a
colaboração dos discípulos – eliminar o sistema opressor, responsável pela fome
e pela miséria. O mundo novo que Jesus veio propor não assenta numa lógica de
poder e autoridade, mas no serviço simples e humilde que leva a partilhar a
vida com os irmãos.
Jesus
propõe uma nova atitude. É necessário substituir o egoísmo pelo amor e pela
partilha. A comunidade de Jesus tem a função de descobrir esta lógica, de acolher
e de propô-la ao mundo. Ela tem de aprender que os bens são um dom de Deus,
destinados a todos. Quem quiser acompanhar Jesus neste caminho, passará
seguramente da escravidão do lucro para a liberdade da partilha, do serviço, do
amor aos irmãos. Desta forma, Jesus não apresenta um milagre econômico e nem
religioso, mas a partilha dos bens da Criação. Não deixa ninguém passar fome,
não apenas materialmente, mas torna-se nosso alimento, através do pão e do
vinho, corpo e sangue, alimento eterno. É o banquete da Vida, que sacia
plenamente aqueles que dele participam. Assim, a eucaristia não deve ser um
mero ritual, deve indicar partilha da Vida. Partilha do Pão da Vida, que é
Jesus e partilha do pão que dá a vida material, que indica a autenticidade da
eucaristia. Como consequência não haverá mais carências, materialmente, afetivamente
ou espiritualmente.
Partilha
é gesto concreto de amor, que contagia e transforma a comunidade. A proposta de
vida nova nasce e cresce na partilha dos bens da criação. Quando partilhamos
esses bens (terra, moradia, saúde, educação, comida) é possível saciar a todos
e ainda sobrar. A Eucaristia, nesse sentido, é o memorial da vida nova
inaugurada por Jesus. Celebrá-la é tomar consciência disso, fazendo tudo o que
for possível para construir uma sociedade justa, fraterna e igualitária. E assim,
Jesus nos convida a alimentar de sua palavra e da eucaristia, para que pessoa
alguma venha a passar fome. Esta atitude começa no momento em que a força do
pão do céu transformará a todos numa comunidade de partilha e de
responsabilidade que age com os olhos e o coração de Deus: “com cinco pães e dois peixes será
possível modificar a vida de muitos irmãos e irmãs em todas as partes”, fazendo
o “milagre” da partilha. Isso nos mostra que a solução para os problemas da
fome e da miséria, não está num milagre, mas na consciência coletiva e na corresponsabilidade
solidária, construída pela comunhão entre todos. Ao se compadecer dos pobres e
famintos, Jesus nos ensina que devemos ter compaixão e partilharmos com eles, o
muito ou o pouco que temos, pois, Deus não abandona seus filhos, uma vez que
nada e ninguém pode nos separar do amor de Deus por nós, manifestado em Cristo
Jesus, nosso Senhor. Senhor! Abençoe e multiplique o nosso alimento! Assim
seja! Amém.
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