domingo, 22 de março de 2015

“Queremos ver Jesus”


Neste Santo Domingo ecoa, com insistência, a preocupação de Deus no sentido de apontar a homens e mulheres o caminho da salvação e da vida definitiva. A Palavra de Deus garante-nos que a salvação passa por uma vida vivida na escuta atenta dos projetos de Deus e na doação total aos irmãos.

Na primeira leitura, Javé apresenta a Israel a proposta de uma nova Aliança. Esta Aliança implica que Deus mude o coração do Povo, pois, só com um coração transformado, homens e mulheres serão capazes de pensar, de decidir e de agir de acordo com as propostas de Deus.
Fazer parte da comunidade da nova Aliança não tem a ver com o cumprimento de ritos ou de obrigações externas; mas tem a ver com a adesão incondicional do coração às propostas de Deus. O que nos faz membros efetivos da comunidade da nova Aliança não é o ter o nome inscrito no livro de registos de batismos da nossa paróquia, ou o ter celebrado o casamento na igreja, ou o ir à missa ao domingo… Mas é o estar atento aos projetos de Deus, interiorizar as propostas de Deus, conduzir a vida de acordo com os valores de Deus, testemunhar a vida de Deus nos gestos simples do dia a dia, viver em comunhão com Deus. O projeto de uma nova Aliança entre Deus e o seu Povo concretiza-se em Jesus: Ele veio ao mundo para renovar o coração das pessoas, oferecendo-lhes a vida de Deus.

A segunda leitura apresenta-nos Jesus Cristo, o sumo-sacerdote da nova Aliança, que Se solidariza com os homens e mulheres e lhes aponta o caminho da salvação. Este caminho - e que é o mesmo caminho que Jesus seguiu - passa por viver no diálogo com Deus, na descoberta dos seus desafios e propostas, na obediência radical aos seus projetos.
Jesus Cristo é o sumo-sacerdote da nova Aliança, pois, Ele conhece e entende as fragilidades dos homens e está apto a oferecer-lhes a ajuda necessária para que possam alcançar a salvação. Cumprindo integralmente o projeto do Pai, Jesus mostra-nos que o caminho da salvação está na comunhão com Deus, na obediência radical aos projetos de Deus e no dom da vida aos irmãos. Jesus é, assim, um sumo-sacerdote que proporciona eficazmente a salvação, levando-os ao encontro de Deus e da vida plena.

O Evangelho convida-nos a olhar para Jesus, a aprender com Ele, a segui-l’O no caminho do amor radical, do dom da vida, da entrega total a Deus e aos irmãos. O caminho da cruz parece, aos olhos do mundo, um caminho de fracasso e de morte; mas é deste caminho de amor e de doação que brota a vida verdadeira e eterna que Deus nos quer oferecer.
Os “gregos” vieram a Jerusalém “adorar” a Deus no Templo; mas quiseram encontrar-se com Jesus, conhecer Jesus e o seu projeto, tomar contato com a salvação que Ele veio oferecer. Com isto, o autor do Quarto Evangelho sugere que o Templo e o culto antigo já não são mais os lugares onde o homem encontra Deus e a salvação; agora, quem estiver interessado em encontrar a verdadeira libertação deve dirigir-se ao próprio Jesus. Por outro lado, a salvação/libertação que Jesus veio trazer tem um alcance universal e destina-se a todos os homens – mesmo àqueles que vivem fora das fronteiras físicas de Israel (“gregos”).
Estes “gregos” não se dirigem diretamente a Jesus, mas aos discípulos. Haverá aqui, talvez, um aceno à responsabilidade missionária da comunidade de Jesus, encarregada da missão de levar Jesus a todos os povos da terra.
Quem vai ao encontro de Jesus, o que é que vai encontrar?  No horizonte próximo de Jesus, está apenas a cruz. Ele está consciente de que vai sofrer uma morte violenta e maldita, e que todos o vão abandonar como um fracassado. Paradoxalmente, Ele está consciente, também, que nessa cruz se manifestará a “glória” do Filho do Homem.
A morte de Jesus não é um momento isolado, mas o culminar de um processo de doação total de Si mesmo, que se iniciou quando “o Verbo Se fez carne e montou a sua tenda no meio dos homens”; é o último ato de uma vida de entrega total aos projetos de Deus, feita amor até ao extremo. Durante toda a sua existência terrena, Jesus procurou, em cada palavra e em cada gesto, tornar o homem livre de todas as opressões, dotá-lo de dignidade, dar-lhe vida em plenitude. Sem se assustar com a perspectiva da morte, cumprindo até ao fim o projeto libertador de Deus em nosso favor, Jesus levou avante a sua luta pela libertação da humanidade. A sua morte é a consequência do seu confronto com as forças da morte que dominavam o mundo.
Por outro lado, ao dar a vida por amor, Jesus deixa aos seus discípulos a última e a suprema lição, a lição final que eles devem aprender. Com a morte de Jesus na cruz, os discípulos aprendem o amor até ao extremo, o dom total da vida, a entrega radical aos projetos de Deus e à libertação dos irmãos.
O que é que nasce deste “dom” de Jesus? Nasce uma nova humanidade. É uma humanidade que Jesus libertou da opressão, da injustiça, dos mecanismos que geram sofrimento e medo… E é uma humanidade que venceu o egoísmo e que aprendeu que a vida é para ser dada, sem limites, por amor. Não há dúvida que o dom da vida dá abundantes frutos de vida. Na cruz de Jesus manifesta-se, portanto, o projeto libertador de Deus.
Quem quiser “conhecer” Jesus deve olhar para este Homem que põe totalmente a sua vida ao serviço dos projetos de Deus e que morre na cruz para ensinar o amor sem limites. Deve aprender esta verdade que, para Jesus, é evidente: não se pode gerar vida, para si próprio e para os outros, sem entregar a própria vida. A vida nasce do amor, do amor total, do amor que se dá até às últimas consequências. Só o amor como dom total é fecundo e gerador de vida: “em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo caído na terra não morrer, permanece só; se morrer, produz muito fruto”. Quem se ama a si mesmo e se fecha num egoísmo estéril, quem se preocupa apenas com defender os seus interesses e perspectivas, perde a oportunidade de chegar à vida verdadeira, à salvação. Ao contrário, quem é totalmente livre do medo, quem se esquece dos seus próprios interesses e seguranças e se compromete com a luta pela justiça, pelos direitos, pela dignidade e liberdade, quem ama tanto os outros que entrega a sua vida por eles, este dará frutos de vida e viverá uma vida plena, que nem a morte calará. É esta vida que tem sentido e que leva o homem à realização plena.
Jesus viveu esta dinâmica da vida dada por amor, sem medo de enfrentar o “mundo” – isto é, sem medo de enfrentar esse sistema de opressão e de injustiça que pensava poder manter os homens escravos através do medo da morte. Jesus está livre deste medo e, portanto, está livre para amar totalmente. Àqueles que querem “ver Jesus” e conhecer o seu projeto, Ele propõe o mesmo caminho – o caminho do amor e da entrega total. Ser discípulo é colaborar com Jesus na libertação de homens e mulheres que ainda são escravos, mesmo que isso signifique enfrentar as forças de opressão do “mundo” e enfrentar a própria morte: “se alguém Me quer servir, siga-Me”. Quem aceitar esta proposta permanece unido a Jesus, entra na comunidade de Deus. Poderá ser desprezado pelo “mundo”; mas será honrado por Deus e acolhido como seu filho.
O nosso texto termina com a “voz do céu” que glorifica Jesus. É uma forma de mostrar que o caminho de Jesus tem o selo de garantia de Deus. A “voz do céu” assegura que a forma de viver proposta por Jesus é verdadeira e que Deus garante a sua autenticidade. Confirma-se, desta forma, aos discípulos que oferecer a vida por amor não é um caminho de fracasso e de morte, mas um caminho de glorificação e de vida. É através da comunidade dos discípulos que “vemos Jesus”, descobrimos o seu projeto, encontramos este caminho de amor e de doação que conduz à vida nova, à salvação. Isto recorda-nos a nossa responsabilidade de testemunhas de Jesus e da sua salvação no meio do povo e afirmarmos categoricamente: “Queremos ver Jesus”… Assim seja! Amém.

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