domingo, 4 de maio de 2014

Fica Conosco Senhor


Irmãos e irmãs,
Este Santo Domingo convida-nos a descobrir esse Cristo vivo que acompanha-nos pelos caminhos do mundo, que com a sua Palavra anima os corações magoados e desolados, que se revela sempre que a comunidade dos discípulos se reúne para “partir o pão”; apela, ainda, a que os discípulos sejam as testemunhas da ressurreição.

A primeira leitura mostra, através da história de Jesus, como do amor que se faz dom a Deus e aos irmãos, brota sempre ressurreição e vida nova; e convida a comunidade de Jesus a testemunhar sempre essa realidade. O texto que nos é proposto resume, pois, os dados fundamentais da catequese cristã primitiva, Jesus passou pelo mundo realizando gestos que testemunhavam a dinâmica de Deus e a sua proposta de salvação; a proposta de Jesus chocou com a recusa do mundo e Ele foi morto na cruz; no entanto, Deus ressuscitou-O, mostrando que uma vida posta ao serviço do projeto de Deus não pode terminar no fracasso, mas conduz à ressurreição, à vida plena. Pedro é aqui o porta-voz dessa comunidade que testemunhou a oferta de salvação que Jesus veio trazer e que recebeu de Jesus a missão de a anunciar a salvação a todos (as). Temos aqui, portanto, o testemunho da comunidade cristã sobre Jesus, o Messias, enviado ao mundo para cumprir o plano de Deus, isto é, para libertar e para instaurar um Reino de justiça, de abundância, de paz. A vitória de Jesus sobre a morte e a sua exaltação atestam que Ele é esse Messias, enviado por Deus com uma proposta de salvação. Os cristãos são as testemunhas disto diante de todo o mundo.

A segunda leitura convida-nos a contemplar com olhos de ver o projeto salvador de Deus, o amor de Deus expresso na cruz de Jesus e na sua ressurreição. Constatando a grandeza do amor de Deus, aceitamos o seu apelo a uma vida nova. O cristão é, pois, convidado a contemplar o plano de salvação que Deus quer concretizar em favor da humanidade e que leva Jesus, o Filho de Deus, a morrer na cruz. Constatando a grandeza do amor de Deus e a sua vontade salvífica, homens e mulheres aceitam renascer para uma vida nova e santa, mesmo no meio das dificuldades e perseguições. Dessa forma, nascerá um Povo novo, consagrado ao serviço de Deus.

O Evangelho que nos é proposto põe Cristo, vivo e ressuscitado, a caminhar ao lado dos discípulos, a explicar-lhes as Escrituras, a encher-lhes o coração de esperança e a sentar-Se com eles à mesa para “partir o pão”. É aí que os discípulos O reconhecem.
A cena coloca-nos, em primeiro lugar, diante de dois discípulos que vão a caminho de Emaús. Um chama-se Cléofas; o outro não é identificado, como se Lucas quisesse dizer que podia ser “qualquer um” dos que creem e que tomam conhecimento da história. Os dois estão, nitidamente, tristes e desanimados, pois, os seus sonhos de triunfo e de glória ao lado de Jesus ruíram pela base, aos pés de uma cruz. Esse Messias poderoso, capaz de derrotar os opressores, de restaurar o reino grandioso de David. Em lugar de triunfar, deixou-Se matar numa cruz; e a sua morte é um fato consumado, pois, “é já o terceiro dia depois que isto aconteceu”, o “terceiro dia” após a morte é considerado o dia da morte definitiva, do não regresso do túmulo. Abandonam a comunidade, que doravante, não parece fazer qualquer sentido e regressam à sua aldeia, dispostos a esquecer o sonho, a pôr os pés na terra e a enfrentar, de novo, uma vida dura e sem esperança. A discussão entre eles a propósito de “tudo o que tinha acontecido” deve entender-se neste patamar, essa partilha solidária dos sonhos desfeitos que torna menos doloroso o desencanto.
Na sequência do relato introduz no quadro uma nova personagem, Jesus. Ele faz-se companheiro de viagem destes discípulos em caminhada, interroga-os sobre “o que se passou nestes dias” em Jerusalém, escuta as suas preocupações, torna-se o confidente da sua frustração. Os dois homens contam a história do “mestre” cuja proposta os seduziu; mas a versão que contam termina no túmulo,  falta, na sua descrição, a fé no Senhor ressuscitado, ainda que conheçam a tradição do túmulo vazio. Para responder às inquietações dos dois discípulos e para lhes demonstrar que o projeto de Deus não passava por quadros de triunfo humano, mas pelo amor até às últimas consequências e pelo dom da vida, “começando por Moisés e passando pelos profetas, explicou-lhes em todas as Escrituras o que lhe dizia respeito”.
É na escuta e na partilha da Palavra que o plano salvador de Deus ganha sentido, só através da Palavra de Deus, explicada, meditada e acolhida, os que creem pode perceber que o amor até às últimas consequências e o dom da vida não são um fracasso, mas geram vida nova e definitiva. A escuta da Palavra de Deus dá a entender ao cristão a lógica de Deus e demonstra-lhe que a vida oferecida como dom não é perdida, mas é semente de vida plena. Os discípulos percebem, então, que “o messias tinha de sofrer tudo isso para entrar na glória”, a vida plena e definitiva não está de acordo com os esquemas de Deus, nos êxitos humanos, nos tronos, no poder; mas está no serviço simples e humilde aos irmãos, no dom da vida por amor, na partilha total daquilo que somos e que temos com os irmãos que caminham lado a lado conosco nos caminhos da vida.
Os três, Jesus, Cléofas e o discípulo não identificado, chegam, finalmente, a Emaús. Os discípulos continuam a não reconhecer Jesus, mas convidam-n’O a ficar com eles. Ele aceita e sentam-se à mesa. Enquanto comiam, Jesus “tomou o pão, recitou a bênção, partiu-o e entregou-lho”. As palavras usadas por Lucas para descrever os gestos de Jesus evocam a celebração eucarística da Igreja primitiva. Dessa forma, Lucas recorda aos membros da sua comunidade que é possível encontrar Jesus vivo e ressuscitado, esse Jesus que por amor enfrentou a cruz, mas que continua a fazer-Se companheiro de caminhada nos caminhos da história. Assim, na celebração eucarística dominical sempre que os irmãos se reúnem em nome de Jesus para “partir o pão”, Jesus lá está, vivo e atuante, no meio deles. A última cena da nossa história põe os discípulos a retomar o caminho, a regressar a Jerusalém e a anunciar aos irmãos que Jesus está, efetivamente, vivo.
Portanto, Jesus está vivo e caminha ao nosso lado nos caminhos do mundo. Às vezes, não conseguimos reconhecê-l’O, pois, os nossos corações estão cheios de perspectivas erradas acerca do que Ele é, dos seus métodos e do que Ele pretende; mas, apesar de tudo, Ele faz-Se nosso companheiro de viagem, caminha conosco passo a passo, alimenta a nossa caminhada com a esperança que brota da sua Palavra, faz-Se encontrar na partilha comunitária do pão, Eucaristia..
A nossa narração apresenta o esquema litúrgico da celebração eucarística, a liturgia da Palavra, a “explicação das Escrituras” que permite aos discípulos entenderem a lógica do plano de Deus em relação a Jesus e o “partir do pão”, que faz com que os discípulos entrem em comunhão com Jesus, recebam d’Ele vida e que O reconheçam nesses gestos que são o “memorial” do dom da vida e da entrega. Desta forma, depois de fazer a experiência do encontro com Cristo vivo e ressuscitado na celebração eucarística, cada pessoa que crê é convidado a voltar à estrada, a dirigir-se ao encontro dos irmãos e irmãs e a testemunhar que Jesus está vivo e presente na história e na caminhada de homens e mulheres.
Na nossa caminhada pela vida, fazemos, frequentemente, a experiência do desencanto, do desalento, do desânimo. As crises, os fracassos, o desmoronamento daquilo que julgávamos seguro e em que apostamos tudo, a falência dos nossos sonhos deixam-nos frustrados, perdidos, sem perspectivas. Então, parece que nada faz sentido e que Deus desapareceu do nosso horizonte. No entanto, a catequese que Lucas propõe-nos hoje e garante-nos que Jesus, vivo e ressuscitado, caminha ao nosso lado. Ele é esse companheiro de viagem que encontra formas de vir ao nosso encontro, mesmo se nem sempre somos capazes de O reconhecer e de encher o nosso coração de esperança. Assim, sempre que nos sentamos à mesa com a comunidade e partilhamos o pão que Jesus nos oferece, damo-nos conta de que o Ressuscitado continua vivo, caminhando ao nosso lado, alimentando-nos ao longo da caminhada, ensinando-nos que a felicidade está no dom, na partilha, no amor. “Fica conosco Senhor”, pois, sempre que nos juntamos com os irmãos à volta da mesa de Deus, celebrando na alegria e na festa o amor, a partilha e o serviço, encontramos o Ressuscitado a encher a nossa vida de sentido, de plenitude, de vida autêntica. É na celebração comunitária da Eucaristia que fazemos a experiência do encontro com Jesus vivo e ressuscitado. Assim seja! Amém. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Palavra em mim agradece, pois seu comentário é muito importante para a nossa caminhada dialógica.
Obrigado!