segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Reconhecer Jesus, eis a nossa vocação


Irmãos e irmãs, 
Este Santo Domingo coloca-nos a questão da vocação; e convida-nos a situá-la no contexto do projeto de Deus para os homens e para o mundo. Deus tem um projeto de vida plena para oferecer aos homens e mulheres; e elege pessoas para serem testemunhas desse projeto na história e no tempo.

A primeira leitura apresenta-nos uma personagem misteriosa – Servo de Javé – a quem Deus elegeu desde o seio materno, para que fosse um sinal no mundo e levasse aos povos de toda a terra a Boa Nova do projeto libertador de Deus. Assim, somos convidados, a tomar consciência da vocação a que somos chamados e das suas implicações. Não se trata de uma questão que apenas atinge e empenha algumas pessoas especiais, com um lugar à parte na comunidade eclesial, os padres, as freiras…; mas trata-se de um desafio que Deus faz a cada um dos seus filhos, que a todos implica e que a todos empenha.
A figura do Servo de Javé convida-nos, em primeiro lugar, a tomar consciência de que na origem da vocação está Deus: é Ele que elege, que chama e que confia a cada um uma missão. A nossa vocação é sempre algo que tem origem em Deus e que só se entende à luz de Deus. Contudo, a vocação não se esgota, em nossa aproximação com Deus, mas é sempre em ordem a um testemunho e a uma intervenção no mundo. Aquele que é chamado por Deus é sempre testemunha e é um sinal vivo de Deus, dos seus valores e das suas propostas diante dos outros, pois, só Deus é capaz de transformar o mundo, a partir dos nossos pobres gestos e das nossas frágeis forças. 

A segunda leitura apresenta-nos um “chamado” e Paulo a recordar aos cristãos da cidade grega de Corinto que todos eles são “chamados à santidade” – isto é, são chamados por Deus a viver realmente comprometidos com os valores do Reino. Assim, Paulo revela-nos que Deus chama os homens e as mulheres à santidade. Estou disponível e bem disposto para aceitar esse desafio? Realizar a vocação à santidade não implica seguir caminhos impossíveis de privação, de sacrifício; mas significa, sobretudo, acolher a proposta libertadora que Deus oferece em Jesus e viver de acordo com os valores do Reino. 
A Igreja, a comunidade dos “chamados à santidade”, é constituída por “todos os que invocam, em qualquer lugar, o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo”. É importante termos consciência de que, para além da cor da pele, das diferenças sociais, das distâncias sociais ou culturais, das perspectivas diferentes sobre as questões secundárias da vivência da religião, o essencial é aquilo que nos une e nos faz irmãos: Jesus Cristo e o reconhecimento de que Ele é o Senhor que nos conduz pela história e nos oferece a salvação.

No Evangelho, João é o apresentador oficial de Jesus. A catequese sobre Jesus que aqui é feita através de duas afirmações com um profundo impacto teológico: Jesus é o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo; e é o Filho de Deus que possui a plenitude do Espírito.
A primeira afirmação, “o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”, evoca, provavelmente, duas imagens tradicionais extremamente sugestivas. Por um lado, evoca a imagem do “servo sofredor”, o cordeiro levado para o matadouro, que assume os pecados do seu Povo e realiza a expiação; por outro lado, evoca a imagem do cordeiro pascal, símbolo da ação libertadora de Deus em favor de Israel. Qualquer uma destas imagens sugere que a pessoa de Jesus está ligada à libertação de homens e mulheres. A ideia é, aliás, explicitada pela definição da missão de Jesus: Ele veio para “eliminar” “o pecado do mundo”. 
A palavra “pecado” aparece, aqui, no singular: não designa os “pecados” dos homens, mas um “pecado” único que oprime a humanidade inteira; esse “pecado” parece ter a ver, no contexto exposto por João, com a recusa da proposta de vida com que Deus, desde sempre, quis presentear a humanidade, é dessa recusa que resulta o pecado histórico, que nos oprime. O “mundo” designa, neste contexto, a humanidade que resiste à salvação, reduzido à escravidão e que recusa a luz/vida que Jesus lhe pretende oferecer… Deus propôs-se tirar a humanidade da situação de escravidão em que esta se encontra; enviou ao mundo Jesus, com a missão de realizar um novo êxodo, que nos leve da terra da escravidão para a terra da liberdade.
A segunda afirmação, o “Filho de Deus” que possui a plenitude do Espírito Santo e que batiza no Espírito – completa a anterior. Há aqui vários elementos bem sugestivos: o “cordeiro” é o Filho de Deus; Ele recebeu a plenitude do Espírito; e tem por missão batizar os homens no Espírito. Dizer que Jesus é o Filho de Deus é dizer que Ele é o Deus que se faz pessoa, que vem ao nosso encontro, que monta a sua tenda no meio do povo, a fim de lhes oferecer a plenitude da vida divina. Dizer que o Espírito desce sobre Jesus e permanece sobre Ele sugere que Jesus possui definitivamente a plenitude da vida de Deus, toda a sua riqueza, todo o seu amor. Por outro lado, a descida do Espírito sobre Jesus é a sua investidura messiânica, a sua unção, “messias” = “ungido”. Jesus é, finalmente, aquele que batiza no Espírito Santo. “Batizar no Espírito” significa, um contato total entre o Espírito e o homem, uma chuva de Espírito que cai sobre o homem e lhe empapa o coração. 
A missão de Jesus consiste, portanto, em derramar o Espírito sobre nós; e quem adere a Jesus, é transformado por essa fonte de vida que é o Espírito, abandona a experiência da escuridão, “o pecado”, e alcança o seu pleno desenvolvimento, a plenitude da vida. Desta forma, a declaração de João convida-nos os a voltar-se para Jesus e a acolher a proposta libertadora que, em nome de Deus, Ele faz: só a partir do encontro com Jesus será possível chegar à vida plena, à meta final do Homem Novo e da Nova Mulher. Portanto, a nossa missão – na sequência da de Jesus – consiste em lutar objetivamente contra “o pecado” instalado no coração de cada um de nós e instalado em cada degrau da nossa vida coletiva. Assim, a missão dos seguidores de Jesus consiste em abrir os olhos para reconhecer Jesus, anunciar a vida plena e em lutar contra tudo aquilo que impede a sua concretização na história. Assim seja! Amém.


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