sábado, 12 de março de 2011

Caminhando no deserto com Jesus


Irmãos e irmãs,
Iniciando nossa caminhada quaresmal fiquemos atentos aos apelos que nos vêm da realidade. Conduzidos pelo Espírito, vamos com Jesus ao deserto. E diante das tentações, renovamos nossa fidelidade ao Deus vivo e verdadeiro, sustentados por sua Palavra.

Queridos irmãos e irmãs,
A narrativa da criação mostra que Deus criou a terra para que a humanidade usufrua dela e tenha vida plena, vida em abundância, simbolizada pela árvore da vida. Dessa forma, a humanidade é parte integrante e participante do projeto criativo do Pai; só há uma condição, “subordinar-se” a Deus: obedecer ao seu projeto de vida e fraternidade, não querendo decidir por si mesmo o caminho do bem e do mal, representado pela árvore do conhecimento.
Deus é o Senhor absoluto, e seu projeto é vida e liberdade para todos, no clima de fraternidade e partilha. Quando a humanidade quer se tornar auto-suficiente, se rebela contra o projeto de Deus e faz o seu próprio projeto: liberdade e vida só para si mesmo, sonhando possuir liberdade e vida plena; porém, na sua auto-suficiência, produz o contrario: escravidão e morte. Assim, as relações de fraternidade transformaram-se em relações de poder e opressão; a relação de partilha transforma-se em exploração, e esta produz a riqueza de poucos e a pobreza de muitos. Desse modo, as relações ficam distorcidas, da humanidade entrei si e da humanidade e com a natureza. Nesse sentido, tenhamos em nosso olhar a Campanha da Fraternidade 2011, cujo tema é: Fraternidade e Vida no Planeta e lema: a criação geme em dores de parto. Assim, é preciso estabelecer uma cultura de respeito ao meio ambiente e do lugar em que Deus nos coloca, para vivermos e convivermos com a ética do cuidado, fazendo parte das maravilhas da criação. O projeto de Deus é um projeto de vida, que traduz entre outras coisas, na justiça que gera a paz.

Caríssimos irmãos e irmãs,
Paulo revela-nos na Carta aos Romanos dois reinos e duas conseqüências, fazendo a comparação entre Adão e Cristo. Adão personifica pecado e morte, é o início da humanidade mergulhada no reino do pecado e caminhando para a morte; Cristo, graça e vida, é o início da humanidade introduzida no reino da graça e caminhando para a vida; é o reino da graça, é Dom de Deus que supera o pecado da humanidade.
Paulo afirma que o Batismo é o nascimento para uma vida nova, pois é participação na morte-ressurreição de Jesus. Com isso, desaparece o “Adão”, marcado pela ganância e autossuficiência, para dar lugar à nova maneira de ver e sentir a vida humana, baseada na fraternidade e na justiça que geram a paz. Contudo, porque, no que se refere especificamente à justiça, ainda vivemos situações de morte e de “velha humanidade”?
Há sempre uma escolha envolta dos caminhos da humanidade, há sinais que precisam serem superados em busca de vida nova, que se re-significa em novo homem e nova mulher, fundante na presença de Cristo, cordeiro Santo.

Amados irmãos e irmãs,
Mateus apresenta-nos Jesus, levado pelo Espírito Santo em sua caminhada de deserto. Neste cenário desfavorável e com fome, Jesus é tentado. São João Crisóstomo escreve: “Como o Senhor fazia todas as coisas para nos ensinar, quis também ser conduzido ao deserto e ali ser tentado, a fim de que os batizados, se depois do batismo sofrem maiores tentações, não se assustem com isso, como se fossem algo inesperado”, e:
“Depois que Jesus foi batizado por Sãoo João com água, foi levado pelo Espírito ao deserto, para que ali fosse batizado com o fogo da tentação. Donde se diz que Jesus foi levado ao deserto pelo Espírito. Foi então quando o Pai clamou desde o céu: Este é meu filho muito amado”. Ainda diz: “Foi levado, não obrigado nem preso, mas pelo desejo de combater” “Quanto maior é a solidão, mais tenta o diabo. Por isso tentou a primeira mulher quando esteve só, sem seu marido. Donde se deu ocasião ao demônio que tentasse. Por isso foi conduzido ao deserto”
As tentações pelas quais passam o Salvador-Jesus referem-se principalmente a não cumprir sua missão, realizando atividades que garantam poder e riqueza, que busquem o prestígio e os desejos imediatos. Jesus, porém, resiste a essas tentações. Pois, seu projeto de justiça é transformar as estruturas segundo a vontade de Deus: “Não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”, não pondo Deus a seu próprio serviço ou interesse: “Não tentarás o Senhor teu Deus” e não absolutizando coisas que geram opressão e exploração sobre os homens, criando ídolos:“Adorarás ao Senhor, teu Deus, e somente a ele prestarás culto”.

Irmãos e irmãs em Cristo,
Jesus Cristo foi tentado porque assim o quis, por amor a nós e para a nossa instrução. Jesus quis ensinar-nos, ao permitir ser tentado, como devemos lutar e vencer nas nossas tentações, confiando em Deus, rezando, e com a fortaleza:
“Pois, tendo ele mesmo sofrido pela tentação, é capaz de socorrer os que são tentados” (Hb 2, 18).
Por outro lado, estas tentações de Jesus no deserto, tem um significado muito profunda na História da salvação. Todos os personagens mais importantes da História Sagrada foram tentados e provados: “Por quarenta dias e quarenta noites esteve jejuando. Depois teve fome” (Mt 4, 2). Moisés fez o mesmo antes de promulgar, em nome de Deus, a antiga Lei do Sinai: “Moisés esteve ali com Deus quarenta dias e quarenta noites, sem comer pao nem beber água. Ele escreveu nas tábuas as palavras da aliança” (Ex 34, 28). Também Elias caminhou quarenta dias no deserto para levar até o fim a sua missão de fazer renovar o cumprimento da Lei: “Levantou-se, comeu e bebeu e, depois, sustentado por aquela comida, caminhou quarenta dias e quarenta noites até a montanha de Deus, o Horeb” (1 Rs 19, 8).
Jesus Cristo, depois de ter jejuado durante quarenta dias e quarenta noites, teve fome, como qualquer homem nas mesmas circunstâncias. Antes de começar a Sua obra messiânica e, portanto, de promulgar a Nova Lei ou Novo Testamento, Jesus, o Messias, prepara-se com a oração e o jejum no deserto.

Estimados irmãos e irmãs,
Neste tempo quaresmal, a Igreja Católica segue as pegadas de Cristo Jesus ao estabelecer anualmente o tempo do jejum quaresmal. Com este espírito de piedade devemos viver cada ano o tempo da Quaresma. Será que os católicos estão seguindo o Mestre Jesus ou o mundo inimigo das almas?
Do mesmo modo o retiro de Jesus no deserto convida-nos a prepararmo-nos com a oração e a penitência, antes de empreendermos qualquer atividade ou decisão importante na nossa vida. Antes de tomarmos uma decisão, precisamos rezar e fazer penitência. Seria agradável a Deus e um bem imenso para a alma, se jejuassemos ao menos uma vez por mês; quem for generoso, fará mais de uma vez por mês. Quarenta dias e quarenta noites passou Jesus no deserto, sem tomar alimento algum. Neste longo período, Jesus viveu unido a Seu Pai, ao Pai Eterno.
Depois destes quarenta dias e quarenta noites de jejum, em que a natureza humana de Jesus se encontra debilitada, isto é, enfraquecida; aproximou-se o Tentador e diz a Nosso Senhor: “Se és o Filho de Deus manda que estas pedras se transformem em pães” (Mt 4, 3). É lógico que Jesus estava com muita fome. Embora pudesse fazer esse milagre, transformar pedras em pães, prefere continuar a confiar no Pai e não realizá-lo, porque não entra no seu plano de salvação. Não era esta a fome que atormentava Jesus; era sim a fome das almas. Por isso, Jesus Cristo respondeu ao demônio: “Está escrito: Não só de Pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4, 4). Com a sua posição perante a tentação, Jesus Cristo vem ensinar-nos que as nossas petições a Deus não devem ser em primeiro lugar acerca das coisas que se podem conseguir com o esforço pessoal, nem que vão exclusivamente em benefício próprio; mas antes, acerca das que vão encaminhados para a santidade.
Ainda no seu plano tentador vemos assim: “Se és o Filho de Deus, atira-te para baixo, porque está escrito: Ele dará ordem a seus anjos a teu respeito, e eles te tomarão pelas mãos, para que não tropeces em nenhuma pedra” (Mt 4, 6).
Essa tentação é astuciosa: se Jesus recusasse pular da altura, demonstraria que não confiava em Deus plenamente; se aceitasse pular, obrigaria Deus a enviar em proveito pessoal os seus anjos para salvá-lo.
Jesus Cristo nega-se a fazer milagres inúteis por vaidade ou por vangloria, Ele não é exibicionista, como muitos de hoje, que fingem fazer curas, mas que tudo não passa de falsidade, porque nossa sociedade continua bastante enferma. Jesus respondeu energicamente a Satanás: “Vai-te, Satanás”. Façamos também o mesmo, não dialoguemos com a serpente infernal, porque acabarem caindo. Façamos o sinal da cruz, chamemos por Jesus e gritemos com o coração: “Eu adoro a Deus! Só n’Ele e na sua vontade está a minha paz. Retira-te, Satanás!”. Aprendamos desta atitude de Jesus: durante a Sua vida na Terra, não quis sequer a glória que Lhe pertencia, pois, tendo direito a ser tratado como Deus, assumiu a forma de servo, de escravo. O cristão sabe, portanto, que toda a glória é para Deus e que não pode servir-se da sublimidade e grandeza do Evangelho como instrumento de interesses e de ambições humanas.
Irmãos e irmãs,
Jesus realiza a justiça do Reino vencendo a tentação da abundância, prestígio e poder. Como vencer a tentação o acúmulo e do poder? Quais são as formas alternativas descobertas pelas CEB’s para realizar a justiça do Reino? O que se esconde por trás da concentração dos bens e do poder em nosso país?
A experiência que nós somos levados a fazer neste Tempo Quaresmal é um caminho de amor e de conformação ao nosso Irmão Salvador, que aceitou se conformar a nós em tudo. Em Jesus, cada um de nós pode experimentar a vitória sobre o Mal que permeia homem e mulher em suas relações. As tentações superadas por Jesus revelam que Deus é suficiente, isto é, quem tem a Deus nada lhe falta.
Diante de um mundo que está marcado por tantas conquistas e avanços tecnológicos, a tentação de se sentir insuperável vai, pouco a pouco, tomando conta da mentalidade humana. Ao lado disso, crescem as inquietações dos que ainda se confessam pertencentes a uma comunidade de fé. A provação e a sedução diante das facilidades dos que deixam a disciplina, o bom senso e a conduta moral em segundo plano na vida, no dia a dia, denotam que o ser humano está continuamente diante de forças destrutivas. Sozinho, ninguém resistirá: “Com isso, o diabo o deixou. E os anjos de Deus se aproximaram e puseram-se a servi-lo”(Mt 4.11). Assim a comunidade dos fieis, é fundamental para que o cristão não perca de vista a meta da vida com Deus.
Neste tempo mais propício de profunda reconciliação e busca de experiência concreta em Cristo Jesus, afirmemos:
“Manda teus anjos, sobre nós, e abençoa todos que esperam em vós manda teus anjos, pra nos ensinar, a te louvar e glorificar. Envia também teu espírito de paz, e amor, o meu coração tem sede, do meu Criador.Envia Senhor os teus anjos, pra nos resgatar, pra nos proteger de todo mal,Para nos guiar, Senhor...”
Envolvido pela beleza da criação, Jesus no deserto conclama a esperança de romper como nossos desertos, abrindo novas formas de vida, de relação com homens e mulheres, imagem e semelhança de Deus, e com o cuidado necessário com a mãe-Terra.
Assim, conduzidos pela oração da Campanha da Fraternidade: “Que nesta quaresma nos convertamos. E vejamos que a criação geme em dores de parto, para que possa renascer segundo o vosso plano de amor, por meio da nossa mudança de mentalidade e de atitudes”. Caminhando no deserto com Jesus, vençamos os nossos desertos. Assim seja! Amém.

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