A festa de todos os Santos é momento oportuno para uma revisão de caminhada da comunidade. Olhando para os que nos precederam, santos e mártires, a comunidade é convidada a se questionar sobre seus caminho de santidade. As bem-aventuranças nos desvelam os caminhos que levam ao Pai.
Irmãos e irmãos,
O livro do apocalipse com seu simbolismo mostra-nos o grande dia, o dia da Salvação. A marca na fronte é o sinal da salvação e da presença de Deus. O Povo de Deus, representado pelas doze tribos, é protegido no julgamento, os anjos seguram os quatro ventos, as tribulações, dificuldades. O povo de Deus é apresentado como o Israel total e perfeito. È um povo incontável, por que a salvação está aberta para todos os homens, gente de todas as nações, tribo, povos e línguas. O povo de Deus reconhece que a salvação vem de Deus e do Cordeiro. Não são as coisas e nem os homens em si mesmo que se salvam.
Unidos aos anjos e à criação, o povo de Deus adora a Deus e reconhece que a plenitude do louvor pertence somente a Deus. A comunidade é ungida a denunciar e resistir em meio às tribulações. Não há outro caminho de santidade.
Caríssimos em Cristo,
A segunda Leitura relembra-nos que somos filhos de Deus. Porém, nossa filiação se traduz na prática da Justiça. Ao tentar vivê-las, os cristãos deparam com conflitos, calúnias, perseguições e morte patrocinadas pela sociedade estabelecida que não aderiu ao projeto de Deus. Quem não ama o irmão pratica a injustiça Com Jesus começou a era da justiça: o amor ao irmão que leva à relação, à comunhão, à partilha e à fraternidade. Praticar a justiça, portanto, é amar o irmão, está é a vida na graça de quem conheceu a justiça de Deus, seu amor pelos homens, revelada em Jesus Cristo. O bem-aventurado.
Amados em Cristo
O Santo Evangelho de Mateus revela-nos Jesus proclamando o “novo mandamento” representados pelas bem-aventuranças, anúncio da felicidade, porque proclamam a libertação, e não o conformismo e a alienação. As bem-aventuranças anunciam a vinda do Reino através da Palavra e ação de Jesus. Estas tornam presente no mundo a justiça do próprio Deus. Justiça para aqueles que são incômodos para uma estrutura de sociedade baseada na riqueza que explora e no poder que oprime.
Caríssimos irmãos e irmãs,
Desde o principio foi confiado a Israel a missão de instaurar o Reino de Deus. Foi para Israel que Deus deu a missão de construir o reino de justiça, missão esta, que Mateus revelou-nos, que Israel não conseguiu cumprir.
Neste espaço de tempo que Deus levanta da cidade de Belém – mesma cidade de onde veio Davi – Jesus. Sua missão: cumprir o que Israel não conseguiu: instaurar o Reino de Deus através de Israel.Ao longo das narrativas de milagres e curas, vemos Jesus ressaltando a fé e confiança dos que são de fora de Israel, o que deixa claro a expansão da incumbência de instaurar o Reino. Agora não mais a Israel, mas a todos quantos crêem, está posta à incumbência de instaurar e viver o Reino de Deus. O Reino de Deus é um Reino de Justiça, onde a premissa é o reconhecimento da realeza de Jesus e a instauração deste Reino é visível graças a atuação daqueles que são chamados ao Reino.Tal qual a comunidade retratada por Mateus, nosso povo latino americano encontra-se aflito, oprimido, perseguido. Temos trabalhadores explorados, agricultores sem terra, mulheres e crianças à margem deste sistema. O quadro só muda de cor, mas as figuras são as mesmas, tanto no campo como na cidade: Desigualdade, injustiça, miséria.
O grito do povo oprimido é ouvido? Depende. Há quem ouça, mas há quem ouve e prefere dizer que não ouviu. Poderíamos começar a citar fatos: lutas contra Regime Militar, pelo Direito à Terra, por Educação e Saúde. Pessoas lutaram e lutam por direto e justiça, no campo e na cidade.O que Mateus tem a nos dizer, através das bem-aventuranças? O que as bem-aventuranças querem revelar aos latino-americanos, vítimas de anos de opressão e miséria?
Irmãos e irmãs,
Sendo humildes de espírito, de vocês é o reino dos céus. Aos humildes de espírito, os que têm em suas vidas a batalha pela sobrevivência. Aos que encontram-se oprimidos pela religiões, pelas "vãs filosofias", pelas "misérias culturais", destes pertencem o Reino dos céus. Os que buscam a justiça do Reino são os “pobres em espírito”. Sufocados no seu anseio pelos valores que a sociedade injusta rejeita, esses pobres estão profundamente convictos de que eles têm necessidade de Deus, pois só com Deus esses valores podem vigorar, surgindo assim uma nova sociedade. São os que depositaram sua confiança em Deus enquanto última instância, porque a sociedade lhes negava justiça. “O pobre é a pessoa honrada, piedoso, espiritualizado, justo (praticante da justiça, “ajustado diante de Deus), aberto a Deus e por isso feliz”. O Reino é deles porque, vivendo assim, realizam o pedido de Jesus
Quando chorarem, vocês serão consolados. Quando não houver mais esperança, quando a tristeza vos abater, quando o choro for a resposta do corpo ao desespero que vocês enfrentam, lembrem-se o Pai vai renovar vossa esperança, Ele irá consolar-vos, ajudai-vos, ajuntai-vos, consolai-vos.
Sendo mansos, vocês herdarão a terra. Não! Não baixem as vossas cabeças. Sejam mansos, sejam calmos, mas não sejam omissos. Com paciência e luta, de vocês será a terra da justiça!
Tendo fome e sede de justiça, vocês serão fartos. Não! Não desistam, mesmo quando "coronéis" insistirem em tomar o poder, mesmo quando o governo for bandido, mesmo quando as guerrilhas forem os bandidos, não desistam da busca pela justiça. Grande é a nossa sede. Seremos saciados, felizes seremos neste dia.
Sendo misericordiosos, vocês alcançarão misericórdia. Misericórdia. Palavra difícil para nós. Não podemos combater desigualdade com desigualdade. Não podemos rebater opressão com opressão. Lutemos, reconhecendo nossos erros, sendo compassivos e misericordiosos uns com os outros. Sendo limpos de coração, vocês verão a Deus. "Pureza de coração: desejar uma só coisa". Desejemos o amor de Deus, pois deste amor provem a justiça, a liberdade, a misericórdia. Assim veremos "face à face" o que hoje vemos em parte.
Sendo pacificadores, vocês serão chamados filhos de Deus. Paz! Alvo difícil para nós que convivemos com guerrilhas e violências em nossos países. Ser promotores da paz: loucura em nosso continente. Loucura sim, mas devemos vivê-la, promove-la, para que os homens vejam em nós o retrato do Filho de Deus. Sendo perseguidos por causa da justiça, de vocês é o reino dos céus."Deixar morrer a esperança? Jamais! Desistir da justiça? Jamais baixarei minhas mãos!". As palavras do Padre Josino, morto na luta pelo direito à terra no nordeste do Brasil refletem bem o que queremos dizer a vocês: não desistam da justiça, não baixem as mãos no primeiro tiro de espingarda, não curvem suas cabeças se prenderem aquele que vos lidera, não desistam de lutar pela igualdade, pois de vocês já é o Reino de Deus.
Sendo, por minha causa, injuriados, e perseguidos, e, mentindo, disserem todo mal contra vós. Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós. Não desistam jamais de construir o Reino de Deus. Vão levantar falsas acusações, vão te perseguir, te jogar no fundo de uma cela, vão forjar testemunhas e provas, mas não desistam, não fique tristes, pelo contrário, cantem e dancem. Sim! Cantem, dancem, pois pessoas já sofreram antes de vocês, seja na mão dos regimes militares, seja na mão das polícias e políticos de hoje! Cantem e dancem! Alegrem-se! Exultem! Pois o Reino de Deus é nosso!
Caríssimos em Cristo Jesus,
Não basta ao cristão se conformar, ou seja, não se lamentar quando passar por dificuldades, mas deve, antes de tudo, praticar tais predicados para que possa vivenciar o Reino de Deus. Jesus fala de um Reino que está longe e próximo, dá as diretrizes para os que querem entrar ou se afastar dele. A prática da justiça se traduz na vivencia das bem-aventuranças. A memória dos mártires da caminhada é esperança para a nossa santidade: “sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito”. Iluminados pelas bem-aventuranças proclamemos hoje: Bem-aventurados os que trabalham para o bem comum com todos os bens que possuem: saber, responsabilidade, chefia, dinheiro. Bem-aventurados os que não possuem toda a verdade e aceitam a parte de verdade que existe nos outros. Bem-aventurados os que governam com justiça e verdade e não governam os outros para se governarem a si mesmos. Bem-aventurados os que fazem a paz nas famílias, nas empresas, nas escolas, na política e abdicam de armas, privilégios e honrarias. Bem-aventurados somos todos nós por termos descoberto na misericórdia de Deus a nossa misericórdia, na pobreza e fraqueza do Filho de Deus a nossa pobreza e fraqueza, a nossa fortaleza e a nossa glória. Assim seja! Amém.
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