domingo, 31 de maio de 2015

Trindade, Movimento de Amor!


Irmãos e irmãs,
A Solenidade que hoje celebramos não é um convite a decifrar o mistério que se esconde por detrás de "um Deus em três pessoas"; mas é um convite a contemplar o Deus que é amor, que é família, que é comunidade e que criou homens e mulheres para os fazer comungar nesse mistério de amor.

Na primeira leitura, Javé revela-se como o Deus da relação, empenhado em estabelecer comunhão e familiaridade com o seu Povo. É um Deus que vem ao encontro de homens e mulheres, que lhes fala, que lhes indica caminhos seguros de liberdade e de vida, que está permanentemente atento aos problemas dos homens, que intervém no mundo para nos libertar de tudo aquilo que nos oprime e para nos oferecer perspectivas de vida plena e verdadeira.
Toda a história da relação entre Deus e Israel é uma extraordinária história de relação, na qual se manifesta o amor de um Deus empenhado em estabelecer comunhão e familiaridade com o seu Povo. Javé escolheu Israel de entre todos os povos da terra, veio ao seu encontro, falou-lhe ao coração e realizou gestos destinados a trazer ao Povo ao encontro da vida. De mil formas, Deus fez ouvir a sua voz, indicou caminhos, conduziu o seu Povo da escravidão para a liberdade.

A segunda leitura confirma a mensagem da primeira: o Deus em quem acreditamos não é um Deus distante e inacessível, que se demitiu do seu papel de Criador e que assiste com indiferença e impassibilidade aos dramas de homens e mulheres; mas é um Deus que acompanha com paixão a caminhada da humanidade e que não desiste de oferecer aos homens a vida plena e definitiva.
Os membros da comunidade cristã, que pelo Batismo aderiram ao projeto de salvação que Deus apresentou em Jesus e cuja caminhada é animada pelo Espírito, integram a família de Deus. O fim último da nossa caminhada é a pertença à família trinitária.
O crente que acolhe a proposta de salvação que Deus faz em Jesus vive "no Espírito". Aceitar essa proposta de vida é aceitar uma vida de relação e de comunhão com Deus. Nessa relação, o crente é alimentado com a vida de Deus. Os que aceitam receber a vida de Deus e vivem "no Espírito" são "filhos de Deus": A condição de "filhos" equipara os crentes com Cristo. Eles tornam-se, assim, "herdeiros de Deus e herdeiros com Cristo". É a vida plena e definitiva, que Deus oferece àqueles que aceitaram a proposta de Cristo e percorreram com Ele o caminho do amor, da doação, da entrega da vida.
Assim, o nosso Deus é, de acordo com a catequese de Paulo, o Deus da relação, apostado em vir ao encontro de homens e mulheres, em oferecer-lhes vida, em integrá-los na sua família, em amá-los com amor de Pai, em torná-los herdeiros da vida plena e definitiva. Esta "vocação" deve expressar-se na nossa vida comunitária. A nossa relação com os irmãos deve refletir o amor, a ternura, a misericórdia, a bondade, o perdão, o serviço, que são as consequências práticas do nosso compromisso com a comunidade trinitária.

No Evangelho, Jesus dá a entender que ser seu discípulo é aceitar o convite para se vincular com a comunidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Os discípulos de Jesus recebem a missão de testemunhar a sua proposta de vida no meio do mundo e são enviados a apresentar, a todos os homens e mulheres, sem exceção, o convite de Deus para integrar a comunidade trinitária.
Este texto que descreve o encontro final entre Jesus e os discípulos divide-se em duas partes:
Na primeira, descreve-se o encontro. Jesus, vivo e ressuscitado, revela­-se aos discípulos; e os discípulos reconhecem-n'O como "o Senhor" e adoram-n'O. Ao reconhecimento e à adoração dos discípulos, segue-se uma manifestação do mistério de Jesus, que reflete a fé da comunidade de Mateus: Jesus é que possui todo o poder sobre o mundo e sobre a história; Jesus é "o mestre", cujo ensinamento será sempre uma referência para os discípulos; Jesus é o "Deus­ conosco", que acompanhará, a par e passo, a caminhada dos discípulos pela história.
Na segunda, Mateus descreve o envio dos discípulos em missão pelo mundo. A Igreja de Jesus é, essencialmente, uma comunidade missionária, cuja missão é testemunhar no mundo a proposta de salvação e de libertação que Jesus veio trazer aos homens e mulheres e que deixou nas mãos e no coração dos discípulos. A primeira referência do envio e do mandato que Jesus dá aos discípulos é a da universalidade da missão dos discípulos destina-se a "todas as nações".
A segunda referência dá conta das duas fases da iniciação cristã, conhecidas da comunidade de Mateus: o ensino e o batismo. Começava-se pela catequese, cujo conteúdo eram as palavras e os gestos de Jesus, o discípulo começava sempre pelo catecumenato, que lhe dava as bases da proposta de Jesus. Quando os discípulos estavam informados da proposta de Jesus, vinha o batismo - que selava a íntima vinculação do discípulo com o Pai, o Filho e o Espírito Santo, era a adesão à proposta anteriormente feita.
Uma última referência: Jesus estará sempre com os discípulos, "até ao fim dos tempos". Esta afirmação expressa a convicção - que todos os crentes da comunidade mateana possuíam - que Jesus ressuscitado estará sempre com a sua Igreja, acompanhando a comunidade dos discípulos na sua marcha pela história, ajudando-a a superar as crises e as dificuldades da caminhada.
Este texto é escolhido para o dia da Santíssima Trindade, pois, nele aparece uma fórmula trinitária usada no batismo cristão: "em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". O nosso texto sugere, antes de mais, que ser batizado é estabelecer uma relação pessoal com a comunidade trinitária…  No dia em que fomos batizados, comprometemo-nos com Jesus e vinculamo-nos com a comunidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo.
Quem acolheu o convite de Deus (apresentado em Jesus) para integrar a comunidade trinitária, torna-se testemunha, no meio de homens e mulheres, dessa vida nova que Deus oferece. O papel dos discípulos é continuar a missão de Jesus, testemunhar o amor de Deus e convidar todos (as) a integrar a família de Deus.
A missão que Jesus confiou aos discípulos - introduzir todos na família de Deus - é uma missão universal: as fronteiras, as raças, a diversidade de culturas, não podem ser obstáculo para a presença da proposta libertadora de Jesus no mundo. Todos os homens e mulheres, sem exceção, têm lugar na família de Deus. "Eu estarei convosco até ao fim dos tempos". Esta certeza deve alimentar a coragem com que testemunhamos aquilo em que acreditamos.
A celebração da Solenidade da Trindade não pode ser a tentativa de compreender e decifrar este mistério de "um em três". Mas deve ser, sobretudo, a contemplação de um Deus que é amor e que é, portanto, comunidade. Dizer que há três pessoas em Deus, como há três pessoas numa família - pai, mãe e filho - é afirmar três deuses e é negar a fé; inversamente, dizer que o Pai, o Filho e o Espírito são três formas diferentes de apresentar o mesmo Deus, como três fotografias do mesmo rosto, é negar a distinção das três pessoas e é também negar a fé. A natureza divina de um Deus amor, de um Deus família, de um Deus comunidade, expressa-se na nossa linguagem imperfeita das três pessoas. O Deus família torna-Se trindade de pessoas distintas, porém unidas. Chegados aqui, temos de parar, porque a nossa linguagem finita e humana não consegue "dizer" o indizível, não consegue definir cabalmente o mistério de Deus.
Trindade, Movimento de Amor! Com efeito, a grande revelação que Cristo veio trazer, é que "Deus é Amor". O Ser de Deus é o Amor em estado puro, mais precisamente ainda, é amar. Deus nada pode fazer senão amar. Ora, o amor não existe se não for movimento, reciprocidade, dom e acolhimento. Deus, Aquele que Jesus chama "Abba", só pode existir como fonte de amor. O Pai é a fonte que Se dá, eternamente, gratuitamente. O Filho surge deste dom como a perfeita Imagem do Pai. Quanto ao Espírito, Ele é este mesmo Movimento de Amor que liga eternamente o Pai e o Filho. O Espírito é o "peso" que, brotando do Coração do Pai, O faz "abanar" no dom total de Si mesmo ao Filho. Isto só se pode aceitar na fé, proclamando um Deus que só é Amor e nada mais. É neste Movimento que são mergulhados os batizados. A vida dos cristãos não é uma realidade estática, nem simples conformidade aos mandamentos. É movimento de amor, aberto aos outros, no próprio movimento de amor que é Deus. "Assim como Eu vos amei, amai-vos uns aos outros". Pois, a Solenidade da Santíssima Trindade é, antes de mais, um convite a descobrir o verdadeiro rosto de Deus. Assim seja! Amém.



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