domingo, 9 de março de 2014

"E não nos deixeis cair em tentação..."


Irmãos e irmãs
Neste  início da nossa caminhada quaresmal, a Palavra de Deus convida-nos à “conversão”, isto é, a recolocar Deus no centro da nossa existência, a aceitar a comunhão com Ele, a escutar as suas propostas, a concretizar no mundo, os seus projetos.

O livro do Gênesis mostra que Deus criou homem e mulher para a felicidade e vida em abundância. Quando escutamos as propostas de Deus, conhecemos a vida e a felicidade; mas, sempre que prescindimos de Deus e fechamos em nós mesmos, inventamos esquemas de egoísmo, orgulho e prepotência e percorremos caminhos de morte, que nos afastam do Pai.
É singular o cuidado de Deus na criação: Deus é o oleiro que modela cuidadosa e amorosamente a sua criação; e, ainda mais, transmite a essa obra formado da terra a sua própria vida divina. Assim, o homem ocupa um lugar especial na criação e é para ele que tudo vai ser criado. Portanto, Deus criou homens e mulheres para serem felizes; deu a possibilidade de vida imortal; mas podemos escolher prescindir de Deus e percorrer caminhos onde Deus não está e viver à margem de Deus e das suas propostas, é essa a origem do mal que destrói a harmonia do mundo. Assim, o mal nunca vem de Deus; o mal resulta das nossas escolhas erradas, do nosso orgulho, egoísmo e autossuficiência. Quando escolhemos viver orgulhosamente só, ignorando as propostas de Deus e prescindindo do amor, constrói cidades de egoísmo, injustiça, prepotência, sofrimento, pecado...
De onde vimos? Para onde vamos? Qual o sentido da nossa vida? A palavra de Deus que hoje nos é proposta responde: é Deus o nosso princípio, fonte original e o nosso último destino. Somos seres criados com amor, a quem Deus deu o seu próprio “sopro”, a quem animou com a sua própria vida. O fim último da nossa existência não é o fracasso, a dissolução no nada, mas a vida definitiva, a felicidade sem fim, a comunhão plena com Deus. Para alcançar essa felicidade plena, Deus nada impõe e respeita sempre, de forma absoluta, a liberdade de seus filhos (as); no entanto, insiste em mostrar-nos, todos os dias, o caminho para a plenitude de vida que Ele sonhou para nós. Quando aceitamos a nossa condição de criaturas e reconhecemos em Deus esse Pai que nos dá vida, que nos ama e que nos indica caminhos de realização e de felicidade, construímos uma existência harmoniosa, um “paraíso” onde encontramos vida, harmonia, felicidade e realização.

Paulo propõe-nos dois exemplos: Adão e Jesus. Adão representa aquele que escolhe ficar indiferente as propostas de Deus e decidir, por si só, os caminhos da salvação e da vida plena; Jesus é aquele que escolhe viver na obediência às propostas de Deus e aos projetos do Pai. O esquema de Adão gera egoísmo, sofrimento e morte; o esquema de Jesus gera vida plena e definitiva.
Adão é a imagem daquele que prescinde de Deus e das suas propostas e que escolhe caminhos de orgulho e autossuficiência. Ora, essa escolha produz injustiça, alienação, sofrimento, desarmonia. Por que a humanidade prefere, tantas vezes, esse caminho, o mundo entrou numa economia de pecado; e o pecado gera a morte.
Cristo propôs um outro caminho. Ele viveu numa permanente escuta de Deus e de seus ensinamentos, na fidelidade total aos projetos do Pai. Esse caminho leva à superação do egoísmo, orgulho, da autossuficiência e faz nascer um Homem Novo e uma Nova Mulher, plenamente livre, que vive em comunhão com o Deus que é fonte de vida autêntica, a vitória de Cristo sobre a morte é a prova concreta de que só a comunhão com Deus produz vida definitiva. Foi essa a grande proposta que Cristo fez à humanidade...Assim, Cristo libertou homens e mulheres da economia de pecado e introduziu no mundo uma dinâmica nova, uma economia de graça que gera vida plena e salvação.

O Evangelho apresenta, de forma mais clara, o exemplo de Jesus. Ele recusou, de forma absoluta, uma vida vivida à revelia de Deus e dos seus projetos. A palavra de Deus garante que, na perspectiva cristã, uma vida que ignora os projetos do Pai e aposta em esquemas de realização pessoal é uma vida perdida e sem sentido; e que toda a tentação de ignorar Deus e as suas propostas é uma tentação diabólica e que o cristão deve, firmemente, rejeitar.
O relato que hoje nos é proposto é uma catequese, cujo objetivo é ensinar-nos que Jesus, apesar de ter sentido, como nós, as tentações, soube pôr acima de tudo o projeto do Pai. A catequese sobre as opções de Jesus aparecer em três situações ou “parábolas”.
A primeira “parábola” sugere que Jesus poderia ter escolhido um caminho de realização material, de satisfação de necessidades materiais. É a tentação, que todos nós conhecemos muito bem, de fazer dos bens materiais, a prioridade fundamental da vida. No entanto, Jesus sabe que “nem só de pão vide o homem” e que a realização do homem não está na acumulação egoísta dos bens. A resposta de Jesus sugere que o seu alimento, isto é, a sua prioridade, não é um esquema de enriquecimento rápido, mas é o cumprimento da Palavra, ou seja, da vontade do Pai.
A segunda “parábola” sugere que Jesus poderia ter escolhido um caminho de êxito fácil, mostrando o seu poder através de gestos espetaculares e sendo admirado e aclamado pelas multidões. Jesus responde a esta tentação e afirma que não está interessado em utilizar os dons de Deus para satisfazer projetos pessoais de êxito e de triunfo humano. “Não tentar” o Senhor Deus significa, neste contexto, não exigir de Deus sinais e provas que sirvam para a promoção pessoal e para que se imponha aos olhos dos outros.
A terceira “parábola” sugere que Jesus poderia ter escolhido um caminho de poder, domínio, prepotência, ao jeito dos grandes da terra. No entanto, Jesus sabe que a tentação de fazer do poder e do domínio a prioridade fundamental da vida é uma tentação diabólica; por isso, diz que, para Ele, só o Pai é absoluto e que só Ele deve ser adorado.
Israel, caminhando pelo deserto, sucumbiu frequentemente à tentação de ignorar os caminhos e as propostas de Deus. Jesus, a contrário, venceu a tentação de prescindir de Deus e de escolher caminhos à margem dos projetos do Pai. De Jesus nasce um povo de Deus, cuja vocação essencial é viver em comunhão com o Pai e concretizar o seu projeto para o mundo e para homens e mulheres.
Assim, a questão essencial que a Palavra de Deus hoje nos propõe é, portanto, que Jesus recusou de forma absoluta, conduzir a sua vida à margem de Deus e das suas propostas. Quando esquecemos Deus e as suas propostas, e nos fechamos no egoísmo e na autossuficiência, facilmente caímos na escravidão de outros deuses que, no entanto, estão longe de assegurar vida plena e felicidade duradoura.
As três tentações hoje apresentadas são três faces de uma única tentação: a tentação de prescindir de Deus, escolher um caminho egoísmo, de orgulho e autossuficiência, à margem das propostas de Deus. Mas, para Jesus, ser “Filho de Deus” significa viver em comunhão com o Pai, escutar a sua voz, realizar os seus projetos, cumprir obediente os seus planos. Ao longo da sua vida, diante das diversas “provocações” que os adversários Lhe lançam, Jesus vai confirmar esta sua “opção fundamental” e vai procurar concretizar, com total fidelidade, o projeto do Pai. Que o Espírito Santo nos torne fiéis à tua Palavra, a exemplo de Jesus; livrando-nos das tentações, que o “não nos deixeis caíres em tentação” se efetive em nossa caminhada, para que possamos segui-Lo no caminho de vida, pois, “é para a liberdade que Cristo nos libertou”. Assim seja! Amém.

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