domingo, 29 de setembro de 2013

Opção pelos pobres, razão nossa de ser


Irmãos e irmãs,
Este Santo Domingo propõe-nos, de novo, a reflexão sobre a nossa relação com os bens deste mundo… Convida-nos a vê-los, não como algo que nos pertence de forma exclusiva, mas como dons que Deus colocou nas nossas mãos, para que os administremos e partilhemos, com gratuidade e amor.

Na primeira leitura, o profeta Amós denuncia violentamente uma classe dirigente ociosa, que vive no luxo à custa da exploração dos pobres e que não se preocupa minimamente com o sofrimento e a miséria dos humildes. É evidente que Deus não está disposto a pactuar com isto. A classe dominante da Samaria está a infringir gravemente os mandamentos da “aliança” e Deus não aceita ser cúmplice daqueles que mantêm um elevado nível de vida à custa do sangue e das lágrimas dos pobres.  Assim, o profeta anuncia que Deus não vai pactuar com esta situação, pois, este sistema de egoísmo e injustiça não tem nada a ver com o projeto que Deus sonhou para os homens e para o mundo.

A segunda leitura traça o perfil do “homem de Deus”: deve ser alguém que ama os irmãos, que é paciente, que é brando, que é justo e que transmite fielmente a proposta de Jesus. Poderíamos, também, acrescentar que é alguém que não vive para si, mas que vive para partilhar tudo o que é e que tem com os irmãos?
O verdadeiro “homem de Deus” tem de distinguir-se por uma vida santa, enraizada na fé e no amor aos irmãos. Em concreto, o “homem de Deus” deve cultivar a justiça, a piedade, a fé, o amor, a perseverança, a doçura. Tem de ser paciente e manso, diante das dificuldades que o serviço apostólico levanta. Deve guardar “o mandamento do Senhor” – isto é, a verdade da fé que lhe foi transmitida pela tradição apostólica. No que diz respeito ao perfil do “homem de Deus”, tudo se resume no amor para com os irmãos, no entusiasmo pelo ministério e na capacidade de transmitir a verdadeira doutrina, herdada dos apóstolos.

O Evangelho apresenta-nos, através da parábola do rico e do pobre Lázaro, uma verdadeira catequese sobre a posse dos bens… Na perspectiva de Lucas, a riqueza é sempre um pecado, pois, supõe a apropriação, em benefício próprio, de dons de Deus que se destinam a todos os homens… Por isso, o rico é condenado e Lázaro recompensado.
A parábola tem duas partes. Na primeira, Lucas apresenta os dois personagens fundamentais da história: um rico que vive luxuosamente e que celebra grandes festas e um pobre, que tem fome, vive miseravelmente e está doente. No entanto, a morte dos dois muda radicalmente a situação. O que é que, verdadeiramente, está aqui em causa?
Atentemos aos dois personagens… Do rico diz-se, apenas, que se vestia de púrpura e linho fino, e que dava esplêndidas festas. De resto, não se diz se ele era mau ou bom, se frequentava ou não o templo, se explorava os pobres ou se era totalmente insensível ao seu sofrimento, aparentemente, isso não é decisivo para o desfecho; no entanto, quando morreu, foi para um lugar de tormentos. Do pobre Lázaro diz-se, apenas, que jazia ao portão do rico, que estava coberto de chagas, que desejava saciar-se das migalhas que caíam da mesa do rico e que os cães vinham lamber-lhe as chagas; quando morreu, Lázaro foi “levado pelos anjos ao seio de Abraão”, quer dizer, a um lugar de honra presidido por Abraão. Trata-se do “banquete do Reino”, onde os eleitos se juntarão – de acordo com o imaginário judaico – com os patriarcas e os profetas; não se diz, no entanto, se Lázaro levou na terra uma vida exemplar ou se cometeu más ações, se foi um modelo de virtudes ou foi um homem carregado de defeitos, se trabalhava duramente ou se não quis fazer nada para mudar a sua triste situação…
Nesta história, não parecem ser as ações boas ou más cometidas neste mundo pelos personagens, a história não faz qualquer referência a isso, que decidem a sorte deles no outro mundo. Então, porque é que um está destinado aos tormentos e outro ao “banquete do Reino”?
A resposta só pode ser uma: o que determina a diferença de destinos é a riqueza e a pobreza. O rico conhece os “tormentos” porque é rico; o pobre conhece o “banquete do Reino” porque é pobre. Mas então, a riqueza será pecado? Aqueles que acumularam riquezas sem defraudar ninguém serão culpados de alguma coisa? Ser rico equivale a ser mau e, portanto, a estar destinado aos “tormentos”?
Na perspectiva de Lucas, a riqueza – legítima ou ilegítima – é sempre culpada. Os bens não pertencem a ninguém em particular, nem sequer àqueles que trabalharam duramente para se apossar de uma fatia gorda dos bens que Deus colocou no mundo; mas são dons de Deus, postos à disposição de todos os seus filhos, para serem partilhados e para assegurarem uma vida digna a todos… Quem se apossa – ainda que legitimamente – desses bens em benefício próprio, sem os partilhar, está a defraudar o projeto de Deus. Quem usa os bens para ter uma vida luxuosa e sem cuidados, esquecendo-se das necessidades dos outros homens, está a defraudar os seus irmãos que vivem na miséria. Nesta história, Jesus ensina que não somos donos dos bens que Deus colocou nas nossas mãos, ainda que os tenhamos adquirido de forma legítima: somos apenas administradores, encarregados de partilhar com os irmãos aquilo que pertence a todos. Esquecer isto é viver de forma egoísta e, por isso, estar destinado aos “tormentos”.
Na segunda parte do nosso texto, insiste-se em que a Escritura – na qual os fariseus eram peritos – apresenta o caminho seguro para aprender e assumir a atitude correta em relação aos bens. O rico ficou surdo às interpelações da Palavra de Deus - “Moisés e os Profetas” -  e isso é que decidiu a sua sorte: ele não quis escutar as interpelações da Palavra e não se deixou transformar por ela. O versículo final expressa perfeitamente a mensagem contida nesta segunda parte: até mesmo os milagres mais espetaculares são inúteis, quando o homem não acolheu no seu coração a Palavra de Deus. Só a Palavra de Deus pode fazer com que o homem corrija as opções erradas, saia do seu egoísmo, aprenda a amar e a partilhar.

Anuncia-se, desta forma, que o projeto de Deus passa por um “Reino” de fraternidade, de amor e de partilha. Quem recusa esse projeto e escolhe viver fechado no seu egoísmo e autossuficiência, não pode fazer parte desse mundo novo de fraternidade, que Deus quer propor a homens e mulheres. Portanto, a opção pelos pobres é a razão de ser comunidade cristã, partilhando sempre com gratuidade e amor. Assim seja! Amém.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Palavra em mim agradece, pois seu comentário é muito importante para a nossa caminhada dialógica.
Obrigado!