domingo, 24 de março de 2013

Ramos bentos - sinal de compromisso em Jesus



Neste Santo Domingo somos convidados a contemplar esse Deus que, por amor, desceu ao nosso encontro, partilhou a nossa humanidade, fez-Se servo dos homens, deixou-Se matar para que o egoísmo e o pecado fossem vencidos. A cruz colocada no horizonte próximo de Jesus apresenta-nos a lição suprema, o último passo desse caminho de vida nova que, em Jesus, Deus nos propõe: a doação da vida por amor.


A primeira leitura apresenta-nos um profeta, chamado por Deus a testemunhar no meio das nações a Palavra da salvação. Apesar do sofrimento e da perseguição, o profeta confiou em Deus e concretizou, com teimosa fidelidade, os projetos de Deus. Os primeiros cristãos viram neste “servo” a figura de Jesus. 
A missão que este “profeta” recebe de Deus tem claramente a ver com o anúncio da Palavra. O profeta é o homem da Palavra, através de quem Deus fala; a proposta de redenção que Deus faz a todos aqueles que necessitam de salvação/libertação ecoa na palavra profética. O profeta é inteiramente modelado por Deus e não opõe resistência nem ao chamamento, nem à Palavra que Deus lhe confia; mas tem de estar, continuamente, numa atitude de escuta de Deus. Sua fidelidade à missão alicerça-se na escuta atenta e renovada da palavra de Deus “de manhã em manhã”. Pois, as pessoas servas de Deus, tanto ontem como hoje, demonstram firmeza e determinação em profunda solidariedade com os abatidos e cansados. Elas assumem, na liberdade e na confiança, a missão de espalhar no meio do povo o fermento novo da justiça. 

A segunda leitura apresenta-nos o exemplo de Cristo. Ele prescindiu do orgulho e da arrogância, para escolher a obediência ao Pai e o serviço aos homens, até ao dom da vida. É esse mesmo caminho de vida que a Palavra de Deus nos propõe. Cristo Jesus – nomeado no princípio, no meio e no fim. Cristo aceitou fazer-Se homem, assumindo com humildade a condição humana, para servir, para dar a vida, para revelar totalmente aos homens o ser e o amor do Pai. Não deixou de ser Deus; mas aceitou descer até aos homens, fazer-Se servidor dos homens, para garantir vida nova. 
Jesus revela sua solidariedade radical com os últimos da sociedade, com aquelas pessoas sem valor, desprezadas, excluídas e descartadas. Conduziu sua vida não para a realização de seus interesses próprios. Esse Jesus que se fez escravo nos convida ao seu seguimento. É o nosso Mestre. Ele é Deus e Senhor de todas as coisas. A ele dobramos nossos joelhos e prestamos homenagem, juntamente com toda a criação. Assim, somos chamados à humildade, ao desprendimento, ao dom da vida que Paulo faz aos Filipenses e a todos os crentes: o cristão deve ter como exemplo esse Cristo, servo sofredor e humilde, que fez da sua vida um dom a todos; esse caminho não levará ao aniquilamento, mas à glorificação, à vida plena. 

O Evangelho convida-nos a contemplar a paixão e morte de Jesus: é o momento supremo de uma vida feita dom e serviço, a fim de libertar os homens de tudo aquilo que gera egoísmo e escravidão. Na cruz revela-se o amor de Deus, esse amor que não guarda nada para si, mas que se faz dom total. A morte de Jesus tem de ser entendida no contexto daquilo que foi a sua vida. Desde cedo, Jesus apercebeu-Se de que o Pai O chamava a uma missão: anunciar a Boa Nova aos pobres, sarar os corações feridos, pôr em liberdade os oprimidos. Para concretizar este projeto, Jesus passou pelos caminhos da Palestina “fazendo o bem” e anunciando a proximidade de um mundo novo, de vida, de liberdade, de paz e de amor para todos. Ensinou que Deus era amor e que não excluía ninguém, nem mesmo os pecadores; ensinou que os leprosos, os paralíticos, os cegos não deviam ser marginalizados, pois, não eram amaldiçoados por Deus; ensinou que eram os pobres e os excluídos os preferidos de Deus e aqueles que tinham o coração mais disponível para acolher o Reino; e avisou os “ricos”, os poderosos, os instalados, de que o egoísmo, o orgulho, a auto-suficiência, o fechamento só podiam conduzir à morte.
O projeto libertador de Jesus entrou em choque – como era inevitável – com a atmosfera de egoísmo, de má vontade, de opressão que dominava o mundo. As autoridades políticas e religiosas sentiram-se incomodadas com a denúncia de Jesus: não estavam dispostas a renunciar a esses mecanismos que lhes asseguravam poder, influência, domínio, privilégios; não estavam dispostos a arriscar, a desinstalar-se e a aceitar a conversão proposta por Jesus. Por isso, prenderam, julgaram, condenaram e pregaram Jesus na cruz. 
A morte de Jesus é a consequência lógica do anúncio do Reino: resultou das tensões e resistências que a proposta do “Reino” provocou entre os que dominavam este mundo. Podemos também dizer que a morte de Jesus é o culminar da sua vida; é a afirmação última, porém mais radical e mais verdadeira, daquilo que Jesus pregou com palavras e com gestos: o amor, o dom total, o serviço. Na cruz de Jesus, vemos aparecer Novo Homem e Nova Mulher, que ama radicalmente e que faz da sua vida um dom para todos. Porque ama, vai assumir como missão a luta contra o pecado, isto é, contra todas as causas objetivas que geram medo, injustiça, sofrimento, exploração, morte. Assim, a cruz contém o dinamismo de um mundo novo – o dinamismo do Reino. 
Para além do sentido da paixão e morte de Jesus, convém notar alguns elementos que são próprios de Lucas: “fazei isto em memória de Mim”, expressão não quer só dizer que os discípulos devem celebrar o ritual da última ceia e repetir as palavras de Jesus sobre o pão e sobre o vinho; mas quer, sobretudo, dizer que os discípulos devem repetir a entrega de Jesus, a doação da vida por amor; Jesus avisa aos seus que “o maior” é “aquele que serve”; e apresenta o seu próprio exemplo de uma vida feita serviço e dom. Estas palavras soam a “testamento” e convocam os discípulos para fazerem da sua vida um serviço aos irmãos, ao jeito de Jesus; no jardim das Oliveiras, faz referência ao aparecimento do anjo e ao “suor de sangue”, esta cena acentua a fragilidade humana de Jesus que, no entanto, não condiciona a sua submissão total ao projeto do Pai; e sublinha a presença de Deus, que não abandona nos momentos de prova aqueles que acolhem, na obediência, a sua vontade; 
Ainda no relato da paixão de Lucas aparece a ideia fundamental que Jesus é o Deus que veio ao nosso encontro, a fim de manifestar a toda humanidade, em gestos concretos, a bondade e a misericórdia de Deus. Essa ideia está presente no gesto de curar o guarda ferido por Pedro no Jardim do Getsemani; está também presente nas palavras de Jesus na cruz: “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem” - é desconcertante o amor de um Filho de Deus que morre na cruz pedindo desculpa ao Pai para os seus assassinos; está, ainda, presente nas palavras que Jesus dirige ao criminoso que morre numa cruz, ao seu lado: “hoje mesmo estarás comigo no paraíso”; Simão transporta a cruz “atrás de Jesus”. Este dado serve a Lucas para apresentar o modelo do discípulo: é aquele que toma a cruz de Jesus e O segue no seu caminho de entrega e de dom da vida - “se alguém quer vir após Mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz dia após dia e siga-me”; Preocupa-se com as mulheres que choram sua morte: "Chorai antes... sobre vós... e sobre vossos filhos". 
Celebrar a Paixão e Morte de Jesus é abismar-se na contemplação de um Deus a quem o amor tornou frágil... Por amor, ele veio ao nosso encontro, assumiu os nossos limites, experimentou a fome, o sono, o cansaço, conheceu a mordedura das tentações, tremeu perante a morte, suou sangue antes de aceitar a vontade do Pai; e, estendido no chão, esmagado contra a terra, traído, abandonado, incompreendido, continuou a amar. Contemplar a Cruz onde se manifesta o amor de Jesus significa: assumir a mesma atitude de amor, de entrega e solidarizar-se com os que continuam sendo crucificados; denunciar tudo o que gera ódio, divisão, medo; evitar que os homens continuem a crucificar outros homens; aprender com Jesus a entregar a vida por amor. 
Somos convidados a começar a Semana Santa, com um novo ardor... Que o grito de alegria de hoje, não se converta em "crucifica-o", na sexta feira. Que os ramos, que são brotos novos de propósitos santos, não murchem nas mãos e se convertam em ramos secos. Caminhemos até a Páscoa com amor, que os ramos bentos, não sejam vistos como algo folclórico, como amuletos da sorte ou de proteção contra os perigos, mas algo sagrado, que levamos para casa como um sinal visível do compromisso assumido de seguir Jesus no caminho ao Pai. A presença dos ramos em nossos lares deve ser uma lembrança de que hoje aclamamos a Jesus, como nosso Rei, e que desejamos aclamá-lo durante toda a nossa vida, como nosso Salvador, pois, depois de Cristo e seu calvário, a humanidade sabe que não caminha mais sozinha. Assim seja! Amém.

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