domingo, 25 de outubro de 2015

Senhor, faça que eu veja!


Irmãos e irmãs,
Este Santo Domingo fala-nos da preocupação de Deus em que o homem e a mulher alcancem a vida verdadeira e aponta o caminho que é preciso seguir para atingir essa meta. De acordo com a Palavra de Deus que nos é proposta, chegamos à vida plena, aderindo a Jesus e acolhendo a proposta de salvação que Ele nos veio apresentar.

A primeira leitura afirma que, mesmo nos momentos mais dramáticos da caminhada histórica de Israel quando o Povo parecia privado definitivamente de luz e de liberdade, Deus estava lá, preocupando-se em libertar o seu Povo e em conduzi-lo pela mão, com amor de pai, ao encontro da liberdade e da vida plena.
Na perspectiva do profeta, a ação salvadora e libertadora de Deus estender-se-á a todos, inclusive aos "cegos" e aos "coxos". Os "coxos" e os "cegos representam, aqui, aqueles que estão numa situação de fragilidade, de debilidade, de dependência e que são incapazes, por si sós, de deixar essa condição. Também com esses - ou especialmente com esses - Deus quer caminhar. É preciso ver em cada homem ou mulher - no "coxo", no "cego", no velho, no doente, no marginal - um irmão que Deus ama e a quem quer oferecer, por nosso intermédio, a vida plena, a salvação definitiva.

A segunda leitura apresenta Jesus como o sumo-sacerdote que o Pai chamou e enviou ao mundo a fim de conduzir os homens à comunhão com Deus. Com esta apresentação, o autor deste texto sugere, antes de mais, o amor de Deus pelo seu Povo; e, em segundo lugar, pede aos crentes que "acreditem" em Jesus - isto é, que escutem atentamente as propostas que Ele veio fazer, que as acolham no coração e que as transformem em gestos concretos de vida.
Na perspectiva do autor da Carta aos Hebreus, Jesus é o sumo-sacerdote por excelência. Em primeiro lugar, porque Ele foi chamado e destinado por Deus a esta missão; o fato de ser Filho de Deus dá ao seu sacerdócio uma categoria, uma dignidade e uma qualidade suprema, uma vez que o coloca em contato pessoal e íntimo com o Pai, dando dessa forma uma expressão mais completa a essa mediação que Ele é chamado a realizar entre Deus e os homens. Em segundo lugar, porque Ele foi homem, também. Ao assumir a nossa humanidade, Ele experimentou a nossa debilidade e fragilidade e tornou-Se capaz de entender as nossas fraquezas e os nossos pecados e de Se tornar o nosso mediador e intercessor junto do Pai.

No Evangelho, o catequista Marcos propõe-nos o caminho de Deus para libertar-nos das trevas e para o fazer nascer para a luz. Como Bartimeu, o cego, os crentes são convidados a acolher a proposta que Jesus lhes veio trazer, a deixar decididamente a vida velha e a seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida. Dessa forma, garante-nos Marcos, poderemos passar da escravidão à liberdade, da morte à vida.
É natural que Jesus tenha encontrado, quando saía de Jericó, um cego que mendigava junto da estrada... No entanto, parece claro que, à volta desse acontecimento fundamental, Marcos construiu uma catequese para os seus leitores. Quem é, na catequese de Marcos, este "cego" que Jesus encontra ao longo do caminho, quando se dirige para Jerusalém? Ele representa todos esses a quem a teologia oficial considerava pecadores, malditos, impuros, marginais, longe de Deus e da sua proposta de salvação.
O cego da nossa história está sentado à beira do caminho, provavelmente a pedir esmola. O estar sentado significa acomodação, instalação, conformismo. Ele está privado da luz e da liberdade e está conformado com a sua triste situação, sabendo que, por si só, é incapaz de sair dela. O pedir esmola indica a situação de escravidão e de dependência em que o homem se encontra.
Contudo, a passagem de Jesus de Nazaré dá ao cego a consciência da sua situação de miséria, de dependência, de escravidão. Então, Bartimeu percebe o sem sentido da sua situação e sente a vontade de apostar numa outra experiência. A passagem de Jesus na vida de alguém é sempre um momento de tomada de consciência, de questionamento, de desafio, que leva a pôr em causa a vida velha e a sentir o imperativo de ir mais além ... No entanto, Bartimeu está consciente da sua debilidade e sente que, sem a ajuda de Jesus, continuará envolvido pelas trevas da dependência, da escravidão, da instalação ... Por isso, pede: "Jesus, filho de David, tem misericórdia de mim". O título "filho de David" é um título messiânico. Portanto, Bartimeu vê em Jesus esse Messias libertador que, segundo a mentalidade judaica, havia de vir não só para salvar Israel dos opressores, mas também para dar vida em plenitude a cada membro do Povo de Deus.
Antes de referir a intervenção de Jesus, Marcos dá conta da reação dos que estão à volta de Jesus: repreendiam o cego e queriam fazê-lo calar. Quando alguém encontra Jesus e resolve deixar a vida antiga para aderir ao Reino que Jesus veio propor, encontra sempre resistências, que vêm, por vezes, dos familiares, dos amigos, dos colegas. Estes que repreendem e mandam calar o cego representam, portanto, todos aqueles que colocam obstáculos a quem quer deixar a sua situação de miséria e de escravidão para aderir à proposta libertadora que Cristo faz. No entanto, a oposição não só não desarma o cego, como o leva a gritar ainda mais forte: "filho de David, tem misericórdia de mim" ... A incompreensão ou a oposição dos homens e mulheres nunca fazem desistir aquele que viu Jesus passar e que viu n'Ele uma proposta de vida e de liberdade.
Jesus parou e mandou chamar o cego. A cena recorda-nos os relatos do chamamento dos discípulos. Os mediadores que transmitem ao cego as palavras de Jesus dizem-lhe: "coragem, levanta-te que Ele chama-te". Ou seja: deixa a tua situação de miséria, de escravidão e de dependência, porque Jesus chama-te. O chamamento é sempre, nestes casos, a tornar-se discípulo, a seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida.
Em resposta, o cego atirou fora a capa, deu um salto e foi ter com Jesus. A capa podia estar colocada debaixo do cego, como almofada, ou nos seus joelhos, para recolher as moedas que lhe atiravam; em qualquer caso, a capa é tudo o que um mendigo possui, a única coisa de que ele pode separar-se. O deitar fora a capa significa, portanto, o deixar tudo o que se possui para ir ao encontro de Jesus. É um corte radical com o passado, com a vida velha, com a anterior situação, com tudo aquilo em que se apostou anteriormente, a fim de começar uma vida nova ao lado de Jesus.
Jesus perguntou ao cego: "que queres que te faça?". É a mesma pergunta que, pouco antes, Jesus fizera a João e Tiago. A identidade da pergunta acentua, contudo, a diferença da resposta ... Os dois irmãos queriam sentar-se ao lado de Jesus e ver concretizados os seus sonhos de grandeza e de poder; o cego Bartimeu, ao contrário, cansado de estar sentado numa vida de escravidão e de cegueira, quer encontrar a luz para seguir Jesus.
Jesus responde a Bartimeu: "vai, a tua fé te salvou". Ao aderir a Jesus e à sua proposta de salvação, ao aceitar seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida, Bartimeu encontrou a salvação: deixou a vida da escuridão, da escravidão, da dependência em que estava e nasceu para essa vida verdadeira e eterna que, através de Jesus, Deus oferece aos homens e mulheres.
Portanto, depois de encontrar Jesus, Bartimeu transforma-se e torna-se o protótipo do verdadeiro discípulo ... Destinatário privilegiado da proposta de salvação que Jesus traz, ele proclama sem hesitações a sua fé, invoca a ajuda e a misericórdia de Jesus, acolhe sem hesitações o chamamento que lhe é feito, liberta-se da vida velha e, com alegria, decisão e entusiasmo, aceita, sem condições, seguir Jesus no caminho do amor e do dom da vida. É com Bartimeu que os discípulos de Jesus são convidados a identificar-se.
Então, o que é que implica aceitar a proposta que Jesus faz? Fundamentalmente implica - como aconteceu com Bartimeu - tornar-se discípulo ... Ser discípulo de Jesus é aderir à sua pessoa, acolher os seus valores, viver na obediência aos projetos do Pai, fazer da vida um dom de amor aos irmãos; é solidarizar-se com os pequenos, com os pobres, com os perseguidos, com os marginalizados e lutar por um mundo onde todos sejam acolhidos como filhos de Deus, iguais em direitos e em dignidade; é lutar contra as estruturas que geram injustiça, opressão e morte; é ser testemunha, com palavras e com gestos, da verdade, da justiça, da paz, da reconciliação. Quem aceita seguir o caminho do discípulo escolhe viver na luz e está a contribuir para a construção de um mundo novo. É isso, também, que é pedido a todos aqueles a quem Jesus chama à vida nova ... Desta forma, cabe a nós perguntarmo-nos qual é o nosso verdadeiro olhar. E afirmar: "Senhor, faça que eu veja!". Assim seja! Amém.

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