Irmãos
e irmãs,
Este
5º Domingo da Páscoa convida-nos a refletir sobre a nossa união a Cristo; e
diz-nos que só unidos a Cristo temos acesso à vida verdadeira.
A
primeira leitura diz-nos que o cristão é membro de um corpo, o Corpo de Cristo.
A sua vocação é seguir Cristo, integrado numa família de irmãos que partilha a
mesma fé, percorrendo em conjunto o caminho do amor. É no diálogo e na partilha
com os irmãos que a nossa fé nasce, cresce e amadurece e é na comunidade, unida
por laços de amor e de fraternidade, que a nossa vocação se realiza plenamente.
O
encontro com Jesus ressuscitado no “caminho de Damasco” constituiu, para Paulo,
um momento decisivo. A partir desse encontro, Paulo tornou-se o arauto
entusiasta e imparável do projeto libertador de Jesus. A perseguição dos
judeus, a oposição das autoridades, a indiferença dos não crentes, a
incompreensão dos irmãos na fé, os perigos dos caminhos, as incomodidades das
viagens, não conseguiram desencorajá-lo e desarmar o seu testemunho. O exemplo
de Paulo recorda-nos que ser cristão é dar testemunho de Jesus e do Evangelho.
A experiência que fazemos de Jesus e do seu projeto libertador não pode ser
calada ou guardada apenas para nós; mas tem de se tornar um anúncio libertador
que, através de nós, chega a todos os nossos irmãos e irmãs. Por isso, a
vivência da fé é sempre uma experiência comunitária.
A
segunda leitura define o ser cristão como “acreditar em Jesus” e “amar-nos uns
aos outros como Ele nos amou”. São esses os “frutos” que Deus espera de todos
aqueles que estão unidos a Cristo, a “verdadeira videira”. Se praticarmos as
obras do amor, temos a certeza de que estamos unidos a Cristo e que a vida de
Cristo circula em nós.
Na
perspectiva do autor do texto que nos é hoje proposto como segunda leitura, ser
cristão é “acreditar em Jesus” e “amar-nos uns aos outros como Ele nos amou”.
Quem adere a Jesus e à sua proposta de vida, não pode escolher um outro
caminho; o caminho do cristão só pode ser o caminho do amor total, do dom da
própria vida, do serviço simples e humilde aos irmãos ao jeito de Jesus. O amor
aos irmãos é o distintivo dos seguidores de Jesus, é preciso um empenho sério
na construção de uma comunidade cristã que dê cada vez mais testemunho do amor
de Jesus…
O
Evangelho apresenta Jesus como “a verdadeira videira” que dá os frutos bons que
Deus espera. Convida os discípulos a permanecerem unidos a Cristo, pois é d’Ele
que eles recebem a vida plena. Se permanecerem em Cristo, os discípulos serão
verdadeiras testemunhas no meio dos homens da vida e do amor de Deus. Para
definir a situação dos discípulos face a Jesus e face ao mundo, Jesus usa a
sugestiva metáfora da videira, dos ramos e dos frutos…
No
Antigo Testamento e de forma especial na mensagem profética, a “videira” e a
“vinha” eram símbolos do Povo de Deus. Agora,
Jesus apresenta-Se como a verdadeira “videira” plantada por Deus. É Jesus que
irá produzir os frutos que Deus espera. E, de Jesus, a verdadeira “videira”,
irá nascer um novo Povo de Deus. Hoje, como ontem, Deus continua a ser o
agricultor que escolhe as cepas, que as planta e que cuida da sua vinha.
Qual
é o lugar e o papel dos discípulos de Jesus, neste contexto? Os discípulos são
os “ramos” que estão unidos à “videira” – Jesus - e que dela recebem vida.
Estes “ramos”, no entanto, não têm vida própria e não podem produzir frutos por
si próprios; necessitam da seiva que lhes é comunicada por Jesus. Por isso, são
convidados a permanecer em Jesus. O verbo permanecer é a palavra-chave do nosso
texto. Expressa a confirmação ou renovação de uma atitude já anteriormente
assumida. Supõe que o discípulo tenha já aderido anteriormente a Jesus e que
essa adesão adquira agora estatuto de solidez, de estabilidade, de constância,
de continuidade. É um convite a que o discípulo mantenha a sua adesão a Jesus,
a sua identificação com Ele, a sua comunhão com ele… Se o discípulo mantiver a
sua adesão, Jesus, por sua vez, permanece no discípulo – isto é, continuará
fielmente a oferecer ao discípulo a sua vida.
O
que é, para o discípulo, estar unido a Jesus? Jesus avisou: “Quem realmente
come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em Mim e Eu nele” … A “carne”
de Jesus é a sua vida; o “sangue” de Jesus é a sua entrega por amor até à
morte; assim, “comer a carne e beber o sangue” de Jesus é assimilar a
existência de Jesus, feita serviço e entrega por amor, até ao dom total de si
mesmo. Está unido a Jesus e permanece n’Ele quem acolhe no coração essa
proposta de vida e se compromete com uma existência feita entrega a Deus e aos
irmãos, até à doação completa da vida por amor; é algo que depende da decisão
livre e consciente do discípulo – uma decisão que tem de ser, aliás, continuamente
renovada.
Para
os discípulos - “os ramos”, interromper a relação com Jesus significa cortar a
relação com a fonte de vida e condenar-se à esterilidade. Quem se recusa a
acolher essa vida que Jesus propõe e prefere conduzir a sua existência por
caminhos de egoísmo, de autossuficiência, de fechamento, é um ramo seco que não
responde à vida que recebe da “videira”. Não produz frutos de amor, mas frutos
de morte.
Ora,
a comunidade de Jesus - os “ramos” - não pode condenar-se à esterilidade. A sua
missão é dar frutos. Por isso, o “agricultor” - Deus - atua no sentido de que o
“ramo” - o discípulo - se identifique cada vez mais com a “videira” - Jesus
Cristo - e produza frutos de amor, de doação, de serviço, de libertação dos
irmãos. A ação de Deus vai no sentido de “limpar” o “ramo” a fim de que ele dê
mais fruto. “Limpar” significa chamá-lo a um processo de conversão contínua que
o leve a recusar caminhos de egoísmo e de fechamento, para se abrir ao amor.
Dito de outra forma: a limpeza dos “ramos” faz-se através de uma adesão cada
vez mais fiel a Jesus e à sua proposta de amor. Os discípulos de Jesus estão
“limpos”, pois, aderiram a Jesus, são a cada instante confrontados com a sua
proposta de vida e respondem positivamente ao desafio que lhes é feito. Se,
apesar do esforço de Deus e do seu contínuo chamamento à conversão, o “ramo” se
obstina em não produzir frutos condizentes com a vida que lhe é comunicada,
ficará à margem da comunidade de Jesus, da comunidade da salvação. É um “ramo”
que não pertence a essa “videira”.
Jesus
é “a verdadeira videira”, de onde brotam os frutos da justiça, do amor, da
verdade e da paz; é n’Ele e nas suas propostas que homens e mulheres podem
encontrar a vida verdadeira. Hoje, Jesus, “a verdadeira videira”, continua a
oferecer ao mundo e aos homens e mulheres os seus frutos; e fá-lo através dos
seus discípulos. A missão da comunidade de Jesus, que hoje caminha pela
história, é produzir esses mesmos frutos de justiça, de amor, de verdade e de
paz que Jesus produziu. Jesus não criou um gueto fechado onde os seus
discípulos podem viver tranquilamente; mas criou uma comunidade viva e
dinâmica, que tem como missão testemunhar em gestos concretos o amor e a
salvação de Deus. Se os nossos gestos não derramam amor sobre os irmãos que
caminham ao nosso lado, se não lutamos pela justiça, pelos direitos e pela
dignidade dos outros homens e mulheres, se não construímos a paz e não somos
arautos da reconciliação, se não defendemos a verdade, estamos a trair Jesus e
a missão que Ele nos confiou. No entanto, o discípulo só pode produzir bons
frutos se permanecer unido a Jesus. No dia do nosso Batismo, optamos por Jesus
e assumimos o compromisso de O seguir no caminho do amor e da entrega; quando
celebramos a Eucaristia, acolhemos e assimilamos a vida de Jesus – vida
partilhada com os homens, feita entrega e doação total por amor, até à morte. O
cristão tem em Jesus a sua referência, identifica-se com Ele, vive em comunhão
com Ele, segue-O a cada instante no amor a Deus e na entrega aos irmãos. O
cristão vive de Cristo, vive com Cristo e vive para Cristo.
Assim,
a comunidade cristã é o lugar privilegiado para o encontro com Cristo, “a
verdadeira videira” da qual somos os “ramos”. É no âmbito da comunidade que
celebramos e experimentamos – no Batismo, na Eucaristia, na Reconciliação – a
vida nova que brota de Cristo. A comunidade cristã é o Corpo de Cristo; não é
possível continuar unido a Cristo e a receber vida de Cristo, em ruptura com os
nossos irmãos na fé. Permanecendo em Cristo, como discípulos, se constrói e
cresce a Vinha do Senhor, o Corpo de Cristo, que é a Igreja. Desta forma, a
vida de Jesus tem de transparecer nos nossos gestos e, a partir de nós, atingir
os irmãos e irmãs. Assim seja! Amém.
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