Irmãos e irmãs,
A
liturgia deste domingo questiona-nos acerca da atitude que assumimos face aos
bens deste mundo. Sugere que eles não podem ser os deuses que dirigem a nossa
vida; e convida-nos a descobrir e a amar esses outros bens que dão verdadeiro
sentido à nossa existência e que nos garantem a vida em plenitude.
Na
primeira leitura, temos uma reflexão sobre o sem sentido de uma vida voltada
para o acumular bens, constituindo um patamar para partirmos à descoberta de
Deus e dos seus valores e para encontramos o sentido último da nossa
existência. Em concreto, o texto proclama a inutilidade de qualquer esforço
humano, pois, os esforços desenvolvidos pelo homem ao longo da sua vida não
servem para nada. Que adianta trabalhar, esforçar-se, preocupar-se em construir
algo se teremos, no final, de deixar tudo a outro que nada fez? Resume-me a sua
frustração e o seu desencanto nesse refrão: “tudo é vaidade”.
A
grande lição que nos deixa é a demonstração da incapacidade que temos, por si
só, encontrar uma saída, um sentido para a sua vida. Constatando que em si
próprio e apenas por si próprio não conseguimos encontrar o sentido da vida, a
reflexão deste livro força-nos a olhar para o mais além. Para onde? Iluminados
pela fé, já podemos concluir: para Deus. Só em Deus e com Deus seremos capazes
de encontrar o sentido da vida e preencher a nossa existência.
A
segunda leitura convida-nos à identificação com Cristo: isso significa
deixarmos os “deuses” que nos escravizam e renascermos continuamente, até que
em nós se manifeste o Um Novo Ser, que é “imagem de Deus”. Paulo apresenta,
como ponto de partida e chegada, como base sólida da vida cristã, a união com
Cristo ressuscitado. Os cristãos, pelo batismo, identificaram-se com Cristo
ressuscitado; dessa forma, morreram para o pecado e renasceram para uma vida
nova. Essa vida deve crescer progressivamente, mas manifestar-se-á em
plenitude, quando Cristo “aparecer”.
Paulo
descreve ainda as exigências práticas dessa identificação com Cristo
ressuscitado. O cristão deve fazer morrer em si a imoralidade, a impureza, as
paixões, os maus desejos, numa palavra, todos esses falsos deuses que enchem a
vida do velho ser; e, por outro lado, deve revestir-se do Homem/Mulher Novo (a)
– ou seja, deve renovar-se continuamente até que nele se manifeste a “imagem de
Deus” - “sede perfeitos como perfeito é o vosso Pai do céu”. Quando isso
acontecer, desaparecerão as velhas diferenças de povo, de raça, de religião e
todos serão iguais, isto é, “imagem de Deus”. Foi isso que Cristo veio fazer:
criar uma comunidade de novos homens e novas mulheres, que sejam no mundo a
“imagem de Deus”. A identificação com Cristo ressuscitado – que resulta do Batismo
– é, portanto, um renascimento contínuo que deve levar-nos a parecer-nos cada
vez mais com Deus.
No
Evangelho, através da “parábola do rico insensato”, Jesus denuncia a falência
de uma vida voltada apenas para os bens materiais: o homem que assim procede é
um “louco”, que esqueceu aquilo que, verdadeiramente, dá sentido à existência.
Jesus
recusa-Se, delicadamente, a envolver-Se em questões de direito familiar e a
tomar posição por um irmão contra outro - “amigo, quem me fez juiz ou árbitro
das vossas partilhas?”. O que estava em causa na questão era a cobiça, a luta
pelos bens, o apego excessivo ao dinheiro. A conclusão que Jesus explica porque
é que Ele não aceita meter-Se na questão: o dinheiro não é a fonte da
verdadeira vida. A cobiça dos bens, o desejo insaciável de ter, é idolatria:
não conduz à vida plena, não responde às aspirações mais profundas do homem,
não conduz a um autêntico amadurecimento da pessoa. A lógica do “Reino” não é a
lógica de quem vive para os bens materiais; quem quiser viver na dinâmica do
Reino deverá ter isto presente.
A
parábola que Jesus vai apresentar na sequência ilustra a atitude do homem
voltado para os bens perecíveis, mas que se esquece do essencial – aquilo que
dá a vida em plenitude. Apresenta-nos um homem previdente, responsável,
trabalhador, que até podíamos admirar e louvar; mas que, de forma egoísta e
obsessiva, vive apenas para os bens que lhe asseguram tranquilidade e bem-estar
material e nisso, já não o podemos louvar e admirar. Esse homem representa,
aqui, todos aqueles cuja vida é apenas um acumular sempre mais, esquecendo tudo
o resto – inclusive Deus, a família e os outros; representa todos aqueles que
vivem uma relação de “circuito fechado” com os bens materiais, que fizeram
deles o seu deus pessoal e que esqueceram que não é onde está o sentido mais
fundamental da existência.
A
referência à ação de Deus, que põe repentinamente um ponto final nesta
existência egoísta e sem significado, serve, apenas, para mostrar que uma vida
vivida desse jeito não tem sentido e que quem vive para acumular mais e mais
bens é, aos olhos de Deus, um “insensato”.
O
que é que Jesus pretende, ao contar esta história? Convidar os seus discípulos
a despojar-se de todos os bens? Ensinar aos seus seguidores que não devem
preocupar-se com o futuro? Propor aos que aderem ao Reino uma existência de
miséria, sem o necessário para uma vida minimamente digna e humana? Não.
O
que Jesus pretende é dizer-nos que não podemos viver na escravatura do dinheiro
e dos bens materiais, como se eles fossem a coisa mais importante da nossa
vida. Desta forma, esta parábola não se destina apenas àqueles que têm muitos
bens; mas destina-se a todos aqueles que tendo muito ou pouco vivem obcecados
com os bens, orientam a sua vida no sentido do “ter” e fazem dos bens materiais
os deuses que condicionam a sua vida e o seu agir.
Portanto,
a preocupação excessiva com os bens, a busca obsessiva dos bens, constitui uma
experiência de egoísmo, de fechamento, de desumanização, que centra o homem em
si próprio e o impede de estar disponível e de ter espaço na sua vida para os
valores verdadeiramente importantes - os valores do Reino. Quando o coração
está cheio de cobiça, de avareza, de egoísmo, quando a vida se torna um combate
obsessivo pelo “ter”, quando o verdadeiro motor da vida é a ânsia de acumular,
o homem torna-se insensível aos outros e a Deus; é capaz de explorar, de escravizar
o irmão, de cometer injustiças, a fim de ampliar a sua conta bancária. Torna-se
orgulhoso e autossuficiente, incapaz de amar, de partilhar, de se preocupar com
os outros… Fica, então, à margem do Reino.
Neste
mês vocacional, rezemos com fé pelo nosso Papa, Bispo Diocesano, Pároco e por todo o clero. É Missão da
Igreja assumir o papel educador das vocações. Assim, sejamos generosos em
rezar pelas vocações e vamos usar os bens que Deus nos concede, colocando-os em
benefício do próximo, na partilha e na solidariedade, numa atitude de respeito
e de liberdade diante dos bens, sem a eles se escravizar e partilhando-os com o
próximo, fazendo o bem, sendo rico para Deus.
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