Irmãos
e irmãs,
Neste
Santo Domingo, somos convidados a refletir sobre as escolhas que fazemos, pois,
nem sempre o que reluz é ouro e que é preciso, por vezes, renunciar a certos
valores perecíveis, a fim de adquirir os valores da vida verdadeira e eterna.
Na
primeira leitura, um “sábio” de Israel apresenta-nos um “hino à sabedoria”. Assim,
convida-nos a adquirir a verdadeira “sabedoria” que é um dom de Deus, e a
prescindir dos valores efémeros que não realizam o homem. O verdadeiro “sábio”
é aquele que escolheu escutar as propostas de Deus, aceitar os seus desafios,
seguir os caminhos que Ele indica.
Para
o rei, a “sabedoria” tornou-se o valor mais apreciado, superior ao poder, à
riqueza, à saúde, à beleza, a todos os bens terrenos. Ela é a “luz” que indica
caminhos e que permite discernir as opções corretas a tomar. É ela que lhe
permite gozar os bens terrenos com maturidade e equilíbrio, sem obsessão e sem cobiça,
colocando-os no seu devido lugar e não deixando que sejam eles a conduzir a sua
vida e a ditar as suas opções. Ao contrário dos bens terrenos, ela não se
extingue nem perde o brilho: é um valor duradouro, que vem de Deus e que conduz
o homem ao encontro da vida verdadeira, da felicidade perene.
A
segunda leitura convida-nos a escutar e a acolher a Palavra de Deus proposta
por Jesus. Ela é viva, eficaz, atuante. Uma vez acolhida no coração do homem,
transforma-o, renova-o, ajuda-o a discernir o bem e o mal e a fazer as opções
corretas, indica-lhe o caminho certo para chegar à vida plena e definitiva.
A
Palavra de Deus transmitida aos homens por Jesus não é um conjunto de frases ocas,
vagas, estéreis, que se derramam sobre homens e mulheres, que “entram por um
ouvido e saem por outro”, e que não têm impacto na vida daqueles que as
escutam; mas é uma Palavra viva, atuante, transformadora e eficaz, que uma vez
escutada, entra no coração como uma espada afiada e transforma os sentimentos, pensamentos,
valores, as opções, as atitudes; confronta-se com a sinceridade das posições
que assumimos, em nossa relação com Deus, com o mundo e com os outros…. A
Palavra de Deus é uma força decisiva que enche a história e que traz a vida e a
salvação para homens e mulheres.
No
Evangelho, Marcos apresenta-nos um homem que quer conhecer o caminho para
alcançar a vida eterna. Jesus convida-o renunciar às suas riquezas e a escolher
“caminho do Reino” – caminho de partilha, de solidariedade, de doação, de amor.
É nesse caminho – garante Jesus aos seus discípulos – que o homem se realiza
plenamente e que encontra a vida eterna.
Desta
forma, o relato de Marcos é uma catequese sobre as exigências do Reino e do
seguimento de Jesus. Um homem ajoelha-se diante de Jesus e pergunta-Lhe o que
tem de fazer para “alcançar a vida eterna”. Não se trata, desta vez, de alguém
que vem questionar Jesus para O experimentar: a postura do homem, a sua atitude
de respeito, denunciam-no como alguém sincero e bem-intencionado, realmente
preocupado com essa questão vital que é a vida eterna.
A
primeira resposta de Jesus não traz nada de novo e remete o homem para os
mandamentos: “não mates; não cometas adultério; não roubes; não levantes falso
testemunho; não cometas fraudes; honra pai e mãe”. De acordo com a catequese
feita pelos mestres de Israel, quem vivesse de acordo com os mandamentos da
Lei, receberia de Deus a vida eterna. O viver de acordo com as propostas de
Deus é, também na perspectiva de Jesus, um primeiro patamar para chegar à vida
eterna.
O
homem explica, porém, que desde sempre a sua vida foi vivida em consonância com
os mandamentos da Lei. É uma afirmação segura e serena, que o próprio Jesus não
contesta. Jesus reconhece a sinceridade, a honestidade, a verdade da busca
deste homem; por isso, olha para ele “com simpatia” e resolve convidá-lo a subir a um outro
patamar nesse caminho para a vida eterna: convida-o a integrar a comunidade do
Reino.
Desta
forma, Jesus aponta três elementos fundamentais que devem ser assumidos por
quem quiser integrar a comunidade do Reino: não centrar a própria vida nos bens
passageiros deste mundo, assumir a partilha e a solidariedade para com os
irmãos mais pobres, seguir o próprio Jesus no seu caminho de amor e de entrega.
Apesar de toda a sua boa vontade, o homem não está preparado para a exigência
deste caminho e afasta-se triste. Então, Marcos explica que ele estava
demasiado preso às suas riquezas e não estava disposto a renunciar a elas. Este
homem é um piedoso observante da Lei; mas não tem coragem para renunciar às
suas seguranças humanas, aos seus esquemas feitos, aos bens terrenos que lhe
escravizam o coração. A sua incapacidade para assumir a lógica do dom, da
partilha, do amor, da entrega, tornam-no inapto para o Reino. O Reino é
incompatível com o egoísmo, com o fechamento em si próprio, com a lógica do
“ter”, com a obsessão pelos bens deste mundo.
Portanto,
o “caminho do Reino” é um caminho de despojamento de si próprio, que tem de ser
percorrido no dom da vida, na partilha com os irmãos, na entrega por amor. Ora,
quem não é capaz de renunciar aos bens passageiros deste mundo – ao dinheiro,
ao sucesso, ao prestígio, às honras, aos privilégios, a tudo isso que prende homens
e mulheres, e impede de dar-se aos irmãos – não pode integrar a comunidade do
Reino. Não se trata apenas de uma dificuldade, mas de uma verdadeira
impossibilidade, “é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha, do
que um rico entrar no Reino de Deus”, os bens do mundo impõem uma lógica de
egoísmo, de fechamento, de escravidão que são incompatíveis com a adesão plena
ao Reino e aos seus valores. O discípulo que quer integrar a comunidade do
Reino deve estar sempre numa atitude radical de partilha, de solidariedade, de
doação.
Neste
sentido, face a esta exigência de radicalidade, os discípulos perguntam: “quem
pode, então, salvar-se?”. Em resposta, Jesus pronuncia palavras de conforto,
apresentando o poder de Deus como incomparavelmente maior do que a debilidade
humana, “aos homens é impossível, mas não a Deus; porque a Deus tudo é
possível” – . A ação de Deus – gratuita e misericordiosa – pode mudar o coração
de homens e mulheres e fazê-lo acolher as exigências do Reino. É preciso, no
entanto, que estejamos disponíveis para escutar Deus e para se deixar desafiar
por Ele. Assim, os discípulos, pela voz de Pedro, recordam a Jesus que deixaram
tudo para o seguir. A renúncia dos discípulos não é, contudo, uma renúncia que
se justifica por si mesma e que tem valor em si mesma… Os discípulos de Jesus
não escolhem a pobreza porque a pobreza, em si, é uma coisa boa; nem deixam as
pessoas que amam pelo gosto de deixá-las… Quando os discípulos de Jesus renunciam
a determinados valores, muitas vezes valores legítimos e importantes, é em
vista de um bem maior – o seguimento de Jesus e o anúncio do Evangelho. Jesus
confirma a validade desta opção e assegura aos discípulos que o caminho
escolhido por eles não é um caminho de perda, de solidão, de morte, mas é um
caminho de ganho, de comunhão, de vida.
Esta
opção dos discípulos será sempre incompreendida e recusada pelo mundo. Por
isso, os discípulos conhecerão também a perseguição e o sofrimento. As
tribulações não são um drama imprevisto e sem sentido: os discípulos devem
estar preparados para enfrentar, pois, sabem que terão sempre de viver com a
oposição do mundo, enquanto se mantiverem fiéis a Jesus e ao Evangelho. Aconteça
o que acontecer, os discípulos devem estar conscientes de que a opção pelo
Reino e pelos seus valores lhes garantirá uma vida cheia e feliz nesta terra e,
no mundo futuro, a vida eterna. Assim seja! Amém.
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