Irmãos e irmãs,
Este Santo Domingo apresenta
a imagem do casamento como imagem que exprime de forma privilegiada a relação
de amor que Deus estabeleceu com o seu Povo. A questão fundamental é, portanto,
a revelação do amor de Deus.
A primeira leitura
define o amor de Deus como um amor inquebrável e eterno, que continuamente
renova a relação e a transforma, sejam quais forem as suas falhas passadas.
Nesse amor nunca desmentido, reside a alegria de Deus. Retoma-se a conhecida
apresentação da cidade como esposa de Javé, que define de forma muito feliz o
imenso amor, o amor nunca desmentido de Deus pelo seu Povo.
Desta forma, o Deus
da “aliança” quer, com toda a força do seu amor, fazer caminho ao lado do seu
Povo; e só está feliz quando aceitamos esse amor que Deus quer partilhar e que
enche o nosso coração de paz, de vida e de felicidade.
A segunda leitura
fala dos “carismas” – dons, através dos quais continua a manifestar-se o amor
de Deus. Como sinais do amor de Deus, eles destinam-se ao bem de todos; não
podem servir para uso exclusivo de alguns, mas têm de ser postos ao serviço de
todos com simplicidade. É essencial que na comunidade cristã se manifeste,
apesar da diversidade de membros e de carismas, o amor que une o Pai, o Filho e
o Espírito Santo.
Paulo enumera
diferentes tipos de “carismas”; no entanto, deixa bem claro que, apesar da
diversidade, todos eles se reportam ao mesmo Deus, ao mesmo Senhor e ao mesmo
Espírito. Cada um dos crentes possui o Espírito e, portanto, de diverso modo e
medida, recebe “carismas”. O que é fundamental é que esses “carismas” estejam
sempre ao serviço do bem comum.
Não faz qualquer
sentido, pois, discutir qual é o “carisma” mais importante. Também não faz
sentido que os possuidores de “carismas” se considerem “iluminados” e se
confrontem com o resto da comunidade. Faz ainda menos sentido considerar que há
cristãos de primeira e cristãos de segunda… É o mesmo Deus uno e trino que a
todos une; a comunidade tem de ser o espelho dessa comunidade divina, da
comunidade trinitária.
O Evangelho apresenta,
no contexto de um casamento - cenário da “aliança”, um “sinal” que aponta para
o essencial do “programa” de Jesus: apresentar a humanidade o Pai que os ama, e
que com o seu amor os convoca para a alegria e a felicidade plenas.
O episódio narrado
é, pois, uma ação simbólica que aponta para algo mais importante do que o
próprio fenômeno concreto descrito. Que realidade é essa?
O cenário de fundo é
o de um casamento. Ora, o cenário das bodas ou do noivado reflete a relação de
amor entre Javé e o seu Povo. Dito de outra forma, estamos no contexto da
“aliança” entre Israel e o seu Deus.
A essa “aliança”
vem, em certa altura, a faltar o vinho. O “vinho”, elemento indispensável na
“boda”, é símbolo do amor entre o esposo e a esposa. Constata-se, portanto, a
realidade da antiga “aliança”: tornou-se uma relação seca, sem alegria, sem
amor e sem festa, que já não potencia o encontro amoroso entre Israel e o seu
Deus. Esta realidade de uma “aliança” estéril e falida é representada pelas
“seis talhas de pedra destinadas à purificação dos judeus”. O número seis evoca
a imperfeição, o incompleto; a “pedra” evoca as tábuas de pedra da Lei do Sinai
e os corações de pedra de que falava o profeta Ezequiel; a referência à
“purificação” evoca os ritos e exigências da antiga Lei que revelavam um Deus
susceptível, zeloso, impositivo, que guarda distâncias: ora, um Deus assim
pode-se temer, mas não amar… As talhas estão “vazias”, porque todo este aparato
era inútil e ineficaz: não servia para aproximar-nos de Deus, mas sim para o
afastar desse Deus difícil e distante.
Detenhamo-nos,
agora, nas personagens apresentadas. Temos, em primeiro lugar, a “mãe”: ela
“estava lá”, como se pertencesse à boda; por outro lado, é ela que se apercebe
do intolerável da situação - “não têm vinho”: representa o Israel fiel, que já
se tinha apercebido da realidade e que esperava que o Messias pusesse cobro à
situação.
Temos, depois, o
“chefe de mesa”: representa os dirigentes judeus, instalados comodamente, que
não se apercebem – ou não estão interessados em entender – que a antiga
“aliança” caducou. Os “serventes” são os que colaboram com o Messias, que estão
dispostos a fazer tudo “o que Ele disser” para que a “aliança” seja
revitalizada.
Temos, finalmente,
Jesus: é a Ele que o Israel fiel - a “mulher”/mãe se dirige no sentido de dar
nova vida a essa “aliança” caduca; mas o Messias anuncia que é preciso deixar
cair essa “aliança” onde falta o vinho do amor - “que temos nós com isso?”. A
obra de Jesus não será preservar as instituições antigas, mas apresentar uma
radical novidade… Isso acontecerá quando chegar a “Hora” - a “Hora” é, em João,
o momento da morte na cruz, quando Jesus derramar sobre a humanidade essa lição
do amor total de Deus.
O episódio de Caná
marca o início dos sinais de Jesus, que têm como finalidade levar a nova
humanidade à maturidade da fé e á posse da vida. Assim, a comunidade cristã,
entregando-se total e definitivamente ao esposo da humanidade, participa da
Nova Criação, o mundo novo. Vivemos tempos de plenitude, tempos de vinho novo. Os que caminham com Jesus na construção do reino de Deus
são pessoas novas.
O episódio das
“bodas de Caná” anuncia, portanto, o programa de Jesus: trazer à relação entre
Deus e a humanidade o vinho da alegria, do amor e da festa. Este programa – que
Jesus vai cumprir paulatinamente ao longo de toda a sua vida – realizar-se-á em
plenitude no momento da “Hora” – da doação total por amor. Assim seja! Amém.
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